5 de maio de 2019

Benin



Com todos os obstáculos que encontro e a estrada a variar entre autoestrada de piso razoável mas com todas aquelas armadilhas e estrada muito esburacada, a acrescentar a uma atenção a todos os carros porque passo, verificando se os passageiros podem ter um ar suspeito, cheguei às quatro da tarde cansado, quando o pior estava para vir.
Um monovolume, com quatro homens dentro, ficou cerca de um minuto a circular ao meu lado, o passageiro ao lado do condutor a olhar-me fixamente enquanto falava ao telefone. Achei a situação estranha e, ao passarmos junto a uma bomba de gasolina, travei forte e entrei para a bomba, sem tempo deles reagirem. Fiquei ali parado uma meia hora mas, quando arranquei, passados uns quilómetros, vinham eles a circular devagar na faixa da direita. Acelerei e fugi. Uns quilómetros à frente um engarrafamento permitiu que me perdessem de vista definitivamente.
Fui seguindo o GPS que tenho fixo da moto mas, de vez em quando, confirmo o trajecto pelo Maps-me no telemóvel, em que confio mais.
Acontece que desta vez o Maps-me, escolhendo o trajecto mais curto em vez do menos demorado, “enviou-me” através da cidade de Lagos. É um caos completo. As ruas têm enormes buracos por todo o lado e, com a quantidade de transito que a cidade tem, parece não ser possível pará-lo para as reparar. Circulam não só carros e pequenas motos em quantidade como Tuc Tucs e camiões de todos os tamanhos, com cargas pesadíssimas, que ajudam a degradar mais as ruas, com enormes crateras, que causam engarrafamentos sucessivos nos locais em que os condutores as evitam, formando-se uma fila única. Por vezes nem as motos conseguem passar pelos carros e camiões parados. A temperatura, como habitualmente ao longo de todo o meu trajecto africano, tem rondado os 35º de maneira que a situação me deixou muito cansado e me fez perder duas horas.
Sempre havia considerado o transito na India o mais perigoso do mundo, por ser caótico, sem regras. Agora mudei de opinião. Aqui não é tão desorganizado mas quase e tem a agravante de circularem bastante mais depressa que na India e serem muito mais agressivos. Por vezes penso mesmo que me estão a tentar atirar ao chão. Por esse motivo vi aqui mais desastres que no país asiático. Um deles foi uma carrinha de nove lugares que acabara de capotar  numa via rápida de Lagos e logo vinham bandos de populares correr para roubarem o que pudessem, a feridos e ilesos, distraídos com a confusão que se gerou.

Cheguei à fronteira com o Benin ao fim da tarde deste terceiro dia. Foi um alívio deixar a Nigéria, o único país no mundo em que não me senti confortável. Espero nunca ter que lá voltar.
Com 180 milhões de habitantes, é o país mais populoso de Africa. A população continua a aumentar a um ritmo elevado e as autoridades não têm meios para controlar a criminalidade, que se propaga assustadoramente. Ficamos com a ideia que o país é um barril de pólvora pronto a explodir. 
Depois da burocracia da saída da Nigéria, com vários tipos a verem o meu passaporte e repetirem as mesmas perguntas, na entrada do Benim estava um único homem, numa pequena barraca de madeira. Sabia o que era o Carnet, olhou para o visto que eu havia imprimido numa folha de papel depois de o pedir “on line” e logo colocou o carimbo no Passaporte. Confirmou comigo onde colocar o carimbo no Carnet e, em dois minutos, a parte burocrática estava despachada. 
Só que o homem, dos seus 30 anos, atlético, era falador. Começou por falar sobre a maneira como os brancos continuam a tratar os africanos como se fossem atrasados mentais e contou-me que tinha curso universitário e era mestre numa arte marcial de que não me lembro o nome. A conversa vinha a propósito de um francês, num curso militar, que o teria desconsiderado devido à sua cor de pele. Expliquei-lhe que a maioria dos franceses, ao contrário dos portugueses, são racistas e idiotas e que, mesmo no tempo do colonialismo nós tínhamos uma relação com os africanos única, que se mantem até aos dias de hoje, em Africa, no Brasil ou em Timor. O homem simpatizou comigo e, não tendo mais clientes a atravessarem a fronteira aquela hora, ficámos à conversa uns bons vinte minutos. O problema era que ficava de noite e eu evito o mais possível circular sem luz de dia, por ser tão mais perigoso. Lá lhe disse que tinha que seguir viagem e, quando me preparava para arrancar, ele deixou a barraca onde estava sentado e veio ter comigo oferecendo-me uma fisga, daquelas que fazíamos em miúdos, como recordação. Simpático.
Entrei no Benin ao lusco fusco e rapidamente anoiteceu. Felizmente tinha marcado Hotel naquela manhã. A estrada de entrada no país é muito esburacada. Percorri os 30 Km que me separavam da cidade seguindo pequenas motos que pareciam conhecer o piso e evitavam os buracos maiores.
O Hotel era num bairro pobre de ruas de terra com buracos e poças mas interessantíssimo pois pertencia a um artista plástico e funcionava também como galeria de arte, com a exposição de obras de pintura e escultura de artistas de Porto Novo. 
Que contraste com a Nigeria. Como podem países vizinhos serem tão diferentes.

O nome de Porto Novo foi dado à capital do Benin pelo navegador português que, quando ali chegou, a achou parecida com o nosso Porto. Não consegui encontrar qualquer semelhança.

1 comentário: