29 de dezembro de 2014

Flores



A Ilha de Flores foi uma colónia portuguesa desde que aí desembarcámos no século XVI mas, em 1851, o governador Lima Lopes, a atravessar dificuldades financeiras e sem apoio da casa real, vendeu grande parte da ilha aos Holandeses que, três anos mais tarde, ocuparam a totalidade do território.
Durante  a segunda guerra mundial a ilha foi invadida pelos japoneses mas, com o fim da guerra, passou a fazer parte da Indonésia.
Os portugueses, ao contrário dos holandeses, misturavam-se com as populações locais e deixaram por lá não só nomes de famílias como a religião católica. Quase todos os perto de dois milhões de habitantes da ilha são católicos.
A estrada que apanhei para sair do porto de Labuan Bajo começava por subir uma serra num trajeto muito sinuoso e traiçoeiro, com várias partes em obras, pequenos troços em terra, desníveis no alcatrão e zonas a escorregarem muito. Já não chovia mas o alcatrão ainda estava encharcado. Passava pouco das quatro da manhã e não se via ninguém nem um único carro. Durante a primeira hora só me cruzei com um  camião e duas “scooters”, que rodavam juntas. Fui andando devagar e achei graça ver algumas casas muito humildes com iluminações de Natal.
Quando o dia começou a nascer, pelas cinco e meia, fiquei encantado com a beleza da paisagem que me rodeava. Muita vegetação e vales lindos. Um grande lago lá em baixo, com as margens a ziguezaguearem pela serra, produzia uma imagem de autentico bilhete postal.
Pelas sete da manhã parei num pequeno restaurante que tinha um ar mais limpo que os outros e tomei um pequeno almoço de arroz com grelos e um ovo cozido.
Segui depois até Ruteng. Cerca das dez da manhã começou a dar-me o sono e voltei a parar  para beber uma laranjada. Eram onze quando cheguei a Aimere, a vila onde embarcaria para o próximo destino. Comecei por ir ao porto saber quando tinha barco para West Timor, a parte da ilha que pertence à Indonésia. Disseram-me que sairia um no dia seguinte às oito da manhã.
Fui então à procura de sítio onde ficar e indicaram-me um pequeno “resort” com cabanas junto à praia, a meia dúzia de quilómetros.
O dono, descendente de portugueses embora não falasse a língua, chamava-se Francisco Rosário.
Instalei-me e fui para o bar, junto à praia deserta, onde fiquei a ler e tomei vários banhos naquela água morna durante o resto do dia. Era o único cliente mas ao fim da tarde chegou uma simpática italiana que explora uma empresa de mergulho na ilha e com quem jantei um excelente peixe apanhado no dia e cozinhado pelo Francisco.
Deitei-me cedo e acordei às seis da manhã. Tomei o pequeno almoço no bar da praia e segui para o porto. Comprei o bilhete e enquanto esperava no meio de gente e tralha para embarcar apareceu o Francisco, na sua moto, que me disse para eu o seguir que me ajudava a passar à frente da confusão. Parecia dono do porto. Fui atrás dele até à rampa de acesso e aí deu indicações para mandarem a minha moto entrar. Despedi-me e embarquei.

26 de dezembro de 2014

Sumbawa 3


Ao sair do Hotel, pelas nove da manhã, o recepcionista perguntou-me para onde ia e quando lhe referi que pretendia apanhar o ferry para a ilha de Flores disse-me que só havia um por dia que partia às oito da manhã. No dia anterior tinham-me informado que saíam barcos quase de hora a hora de maneira que decidi arrancar até ao Porto, a perto de 60 Km de ali, para estudar a situação “in loco”.
Quando lá cheguei disseram-me que haveria um segundo barco à tarde que deveria partir por volta das quarto.
- “mas não tem horário? sai às quatro ou quatro e meia”?
- “depende do número de clientes”
Eram dez da manhã e decidi então ir fazer a revisão à moto que tinha prevista para Timor. Calculava encontrar o filtro de ar já muito sujo porque sentia a moto a perder potencia gradualmente e temia que as velas também estivessem no estado a que chegaram no Irão, onde a cerâmica queimou, em resultado da má qualidade da gasolina. Como nalguns destes países do sudoeste asiático o combustível também é de fraca octanagem achei que deviam estar a pedir mudança. E estavam.
A operação é demorada nesta moto porque temos que retirar o depósito de combustível, desligar uma série de sensores e as velas dos cilindros da frente do V são de difícil acesso.
Por outro lado este mecânico/viajante também trabalha devagar.
Quando tinha tudo montado de novo, pus a moto a trabalhar e não só a luz de avaria se mantinha acesa como a moto não se aguentava ao ralenti. Achei que teria deixado alguma ficha mal ligada de maneira que voltei a retirar o depósito para deligar e voltar a ligar todas as fichas. Nova montagem e os mesmos sintomas. Entretanto o tempo passava e eu via que quase de certeza perderia o barco daquela tarde. Na segunda desmontagem retirei também a caixa do filtro de ar e só então reparei que tinha deixado um pequeno tubo de vácuo desligado.
Sabia que era o suficiente para aqueles sintomas e quando voltei a montar tudo de novo foi com confiança que pus a moto a trabalhar sem que a luz voltasse a acender.
Já passava das seis da tarde mas decidi ir até ao porto ver o que se passava. O barco ainda lá estava e disseram para me despachar que iria partir de seguida. Estranhei, ao entrar, só lá estar um camião dentro mas estacionei a moto no local onde me indicaram e subi para a zona superior com bancos bastante cómodos.
Começaram então a ser carregados mais camiões mas, com o movimento já parado, pelas oito da noite fui perguntar porque não partíamos.
“Estamos à espera de um cliente que está a chegar”
Quando o barco saiu eram nove da noite. Felizmente tinha um livro para ler e o tempo passou bem. Não tinha comido nada deste o pequeno almoço e no bar do barco arranjaram-me uma espécie de esparguete com o que penso seja tofu, que vem numas embalagens plásticas a que acrescentamos água a ferver. Não é muito mau.
Dormi uma três ou quatro horas e, pelas três e meia da manhã, fui acordado pelos altifalantes do barco a anunciarem a chegada.
Eram quatro da manhã quando saí do barco com a moto. Tinha ideia de ali ficar na vila a dormir mais umas horas numa qualquer pensão de esquina mas estavam todas de portas fechadas de maneira que não tive outro remédio senão arrancar noite dentro.
Como o GPS deixou de funcionar há uns dias e não tinha a quem perguntar o caminho guiei-me pela bússola do iphone para me levar para oriente.
Ao sair da vila os altifalantes de uma mesquita acordavam os fiéis para as rezas matinais e pouco depois vi homens a deixarem as casas à beira da estrada para se porem a pé a caminho do local de culto.

23 de dezembro de 2014

Sumbawa 2



Tinha posto o despertador para as oito e meia  mas acordei meia hora antes. Vesti a roupa que tinha no dia anterior, substituindo o banho com a água do tanque por uma lavagem de cara com água da torneira e fui ver se conseguia tomar um pequeno almoço na vila porque a mulher do dono da espelunca, quando o filho lhe perguntou se tinha alguma coisa para o meu pequeno almoço, levantou-se do chão onde estava sentada e respondeu: “só café”
Encontrei uma barraca onde uma mulher vendia uma espécie de pães de leite embalados em plástico com recheio de coco. Não eram maus  e preferi ao arroz da concorrência. Ainda na vila uma operação stop só para motos. Tinha apanhado já uma em Lombok. Mandam entrar todas as pequenas motos e “scooters” que passam na rua para um desvio onde uma dezenas de polícias verifica os documentos. Foi a primeira vez que me pediram par ver a carta de condução nesta viagem e logo dois dias seguidos. Desta vez também quiseram ver os documentos da moto mas quando viram que isso obrigaria a abrir uma das malas laterais e a minha moto estava a atrasar a fluidez do transito de muitas dezenas de pequenas motos em fila para serem verificadas, mandaram-me seguir.
Arranquei então pela única estrada da ilha que, tal como todas as outras na Indonésia, tem apenas uma faixa para cada lado. A ideia era ir até à capital, Bima,  a 320 Km de onde estava e a 60 do barco que teria que apanhar no dia seguinte.
A parte que vemos de Sumbawa, os arredores desta estrada que atravessa a ilha numa grande parte junto à costa norte, é pouco atrativa, com menos vegetação que o resto do país e até partes de campo bastante secas. No horizonte vi montanhas cobertas de verde mas de difícil acesso.
Em contrapartida a estrada dava imenso gozo, com sequencias de curvas rápidas, feitas em quarta e quinta, como eu gosto. Para além disso o tempo estava ótimo e a temperatura, influenciada pela proximidade do mar, não passava muito dos 30º.
Por isso resolvi logo de manhã vestir as calças do fato e as botas, que sempre dão mais proteção em caso de acidente e deixava-me preparado para a chuva que normalmente aparece da parte da tarde. E assim foi. Estava a menos de 100 Km do destino do dia quando uma enorme carga de água se abateu sobre a zona montanhosa que atravessava na altura. Parei debaixo de um telheiro, junto com outros motociclistas locais, onde ficamos perto de meia hora à espera que passasse o dilúvio.
Quando a chuva baixou de intensidade fui o primeiro a arrancar. Não tinha percorrido mais de dois quilómetros quando, à saída de uma curva larga, em que vinha a uns 85, 90 Km/h estava um lamaçal, com uns 5cm de altura, que a chuva tinha arrastado da montanha. Não tive tempo de fazer nada. Mal entrei no mar de lama “catrapum”, comigo e a moto a sermos arrastados pelo alcatrão uns vinte ou trinta metros. Por sorte tinha vestido o fato completo e não me magoei nada. Alguns homens que estavam em vias de começarem a limpar a estrada vieram rapidamente levantar a moto que também não sofreu muito com a queda. A mala direita amolgada, para se parecer mais com a esquerda, que tinha sofrido com os acidentes na Índia, a maneta de travão partida e os apoios do para brisas arrancados. Compus-me durante uns dois ou três minutos do que não chegou a ser um susto e logo pessoas que moravam ali vieram ajudar. Um deles trouxe mesmo uma mangueira com que tratou de lavar moto e condutor, cobertos de lama. Lá arranquei, mais devagar, para os últimos 90 Km até Bumi, pois a maneta do travão passou a ser um pequeno coto.
Chegado à cidade procurei o concessionário Honda e fui lá fazer as reparações antes de me instalar num Hotel. Aproveitei e mudei também as pastilhas dos travões da frente, que já estavam nas últimas.
Á noite fui a pé procurar um sítio onde jantar. Encontrei uma tasca em que me prometeram uma galinha acabada de assar e, para o provar, mostraram-me as brasas ainda acesas. Quando entrei uma ratazana, quase do tamanho de um pequeno coelho atravessou a sala de uma ponta à outra sem que os clientes se preocupassem ou lhe dessem sequer atenção. Uma banalidade. Tentei esquecer a imagem e jantei a galinha com arroz.

21 de dezembro de 2014

Sumbawa


Quando voltei ao restaurante buscar a moto depois da visita às cascatas ainda tinha as calças encharcadas mas, como estava calor, decidi arrancar mesmo assim para ver se chegava à vila do porto onde embarcaria para Sumbawa antes de anoitecer. A estrada era espetacular, com uma parte montanhosa mas bastante rápida e com o alcatrão a seguir as diferenças de inclinação do terreno, com lombas cegas e curvas com desníveis. Um gozo.
Passava pouco das seis e meia quando cheguei ao porto e me informaram que sairia um barco dentro de meia hora. A minha ideia inicial era ficar a dormir do lado de cá para não ter que andar de noite quando chegasse à outra margem mas não quis desperdiçar a oportunidade, sabendo que no dia seguinte não só o movimento seria muito maior como poderia mesmo não haver barco à hora que me desse jeito.
Fiz assim a travessia já de noite.
Tinham-me dito para tomar especial cuidado nestas ilhas a oriente de Lombok. Aqui já não há turismo, as populações são mais pobres e há bastantes assaltos.
Por essa razão deveria evitar, a todo o custo, andar de noite.
O barco levava não mais de uns 15 passageiros, quatro ou cinco camiões e outras tantas “scooters”. Não viajavam carros. Estacionei a moto, subi para o andar superior com um livro e sentei-me a ler. Passados uns dez minutos uma simpática gorda com um enorme tabuleiro de bananas chamou-me. “Bananas, my love”?
Lembrei-me que tinha almoçado há uma e meia da tarde e provavelmente não encontraria onde jantar na outra margem de maneira que lhe comprei quatro bananas que foram o meu jantar a bordo, acompanhadas de uma água.
Alguns dos passageiros meteram conversa, estranhando um estrangeiro naquelas andanças. Perguntei-lhes se encontraria hotel junto ao porto da outra margem e disseram-me que não. Teria que fazer uma dúzia de quilómetros até à primeira vila.
Um dos homens, de aspecto duvidoso, depois de várias perguntas sobre de onde eu vinha e para onde ia disse-me: “você é rico”. Respondi-lhe que não e cortei a conversa.
Desembarcado em Sumbawa pelas nove e meia arranquei, noite cerrada, por uma estrada quase deserta mas em bom estado a caminho de Alas, a tal vila que me tinham referido. Nesta ilha há praticamente uma única estrada, que a atravessa de ocidente para oriente. As derivações são estreitas vias, muitas das vezes em terra. Mas a ilha tem mais de 400 Km de comprimento.
Chegado a Alas perguntei onde havia um hotel e indicaram-me o que parecia ser o único. Um homem veio receber-me à porta e apresentou-me o filho, que “arranhava” umas coisas de inglês. Insistiu em mostrar-me o quarto mas eu não só já imaginava o que me esperava como, sem alternativa, teria que aceitar fosse o que fosse. O lençol e as almofadas nem tinham um ar sujo mas o edredon não tinha capa, o que não me espantou. Em Mataram, capital de Lombok, tinha insistido com o rapaz do Hotel para me fornecer um lençol para colocar debaixo do cobertor, sem qualquer sucesso. Aqui nem disse nada. Ou seja, limitei-me a dizer que estava ótimo. A casa de banho era um buraco no chão com um tanque de água ao lado, que parecia de um lago estagnado, com aranhas a boiarem. Dentro do tanque a habitual tijela plástica que os muçulmanos usam para se lavarem com água retirada destes tanques. Não há duche e a única torneira corre para dentro do tanque. Lavar os dentes, por exemplo, é uma operação complicada porque evidentemente não utilizamos a água do tanque.
As paredes tinham sujidade acumulada de anos. Impensável andar ali sem ser de sandálias.

17 de dezembro de 2014

Gili Travangan




Saí da capital de Lombok, Mataram, pelas onze da manhã e parti para Norte junto à costa, na direção onde eles me tinham indicado que ficava este grupo de três pequenas ilhas. O passeio é lindo porque aquela zona da costa forma várias pequenas baías com praias entaladas entre o mar e o palmeiral.
Quando vi as ilhas no horizonte e um pequeno porto de mar parei para perguntar se havia quem me levasse às ilhas. Pescadores que tratavam das redes responderam que sim mas pediram-me o equivalente a 30 euros que achei um exagero. Disseram-me então que, meia dúzia de quilómetros à frente, havia barcos que transportavam mais pessoas regularmente. Parti para o porto que me indicaram onde constatei que até tinham um armazém para se guardarem as muitas motos de quem ia para as ilhas trabalhar.
Embarquei num “speed boat”, com três motores de 200 cv. e outros tantos clientes e em dez minutos estávamos a desembarcar em Gili Travangan.
“Transport, sir, transport? where are you staying”?
Pequenas carroças puxadas por um cavalo esperam pelos turistas no porto para os levar aos hotéis. Eu não tinha nada marcado e preferi alugar uma bicicleta com um porta bagagens onde coloquei a pequena mala que trazia e fui explorar a zona.
Em menos de duas horas dei a volta à ilha por um estreito caminho onde se cruzam bicicletas e carroças. Durante o trajeto vários homens me perguntaram se não queria comprar erva, uma massagem ou a própria massagista.
Pelo caminho encontrei o hotel mais atrativo dentro do meu orçamento e deixei logo lá a mala. Era composto por várias cabanas de colmo junto à praia em que uma era a recepção e bar, outra um sítio para se estar sentado em almofadas a ler ou conversar e outras os quartos, com camas grandes de docel e mosquiteiro mas pouco espaço à volta. Do outro lado da entrada na cabana uma porta dava acesso à casa de banho que era ao ar livre, forrada a bamboo, tendo a minha uma enorme palmeira no meio. O duche era uma cana de bamboo de onde a água corria para o chão da casa de banho. Muito giro. 
Na praia tinham não só camas para se estar ao sol como algumas mesas e cadeiras à sombra de árvores e uns coloridos pufos que os empregados se apressavam a retirar de cada vez que começava a chover.
Depois de dar a volta à ilha e responder várias vezes que não me queria drogar nem receber massagens fui à procura de um sítio para almoçar, já pelas três e meia da tarde.
Encontrei um restaurante isolado, junto ao mar, com uma pequena loja de roupa ao lado, que pertence a um jamaicano que ali se instalou. Tinha um ambiente giríssimo com boa música e três empregadas muito animadas e divertidas, de maneira que acabei por voltar lá para jantar nesse dia e almoçar no dia seguinte.
Nas duas ultimas refeições elas andavam numa paródia pegada, a rirem muito até que uma delas me contou que a mais velha, dos seus trinta e muitos anos, estava apaixonada por mim. Convidei-a para jantar e ficou excitadíssima mas quando, num restaurante da vila sobre o mar, à luz das velas, caí na asneira de lhe dizer que partia no dia seguinte, já não quis ficar comigo no Hotel. Era mesmo amor.
Deixei Gili Tanwangan no barco da manhã com vontade de lá voltar, como me tem acontecido em tantos sítios. Na outra margem peguei na moto e arranquei para o lado oriental da ilha de Lombok, a caminho do porto onde apanharia o barco que me levar à seguinte, Sumbawa.
Tinham-me recomendado que, antes de partir, não deixasse de visitar uma zona montanhosa da ilha de Lombok com uma beleza invulgar e umas quedas de água espetaculares de maneira que, ficando até no meu caminho, foi para aí que me dirigi.
Quando lá cheguei, depois de subir a montanha com paisagem de floresta exuberante, vi um restaurante com bom aspecto e parei para almoçar. Tinha uma vista espetacular sobre o vale, com o mar ao longe.
Pouco depois entraram duas miúdas inglesas que se sentaram na mesa ao lado da minha e, quando disseram que também vinham visitar as quedas de água, sugeri irmos juntos.
Embora vários guias nos recomendassem que o caminho para a segunda cascata, que seria a mais espetacular, era quase impossível fazer sem acompanhamento, decidimos ir só os três e foi muito divertido. Atravessámos um rio várias vezes por entre pedras e corrente, ao princípio descalços e de calças arregaçadas mas para o fim com  sapatos e calças encharcadas. Pelo meio caí dentro de água, felizmente numa altura em que tinha passado o meu iphone à Laura.
A cascata era sensacional e tomámos os três um enorme banho debaixo da queda de água.

15 de dezembro de 2014

Lombok




Quando regressei a Denpasar vindo de Ubud passei no Hotel do italiano onde tinha ficado antes, a buscar duas malas que lá tinha deixado e no registo em que tinha pedido uma extensão do meu Visto de entrada no país para depois seguir a caminho do barco que me levaria a Lombok, a próxima ilha a caminho de Timor.
O passaporte não estava pronto e quando saí, já perto das três da tarde, achei que dificilmente apanharia um barco nesse dia. De qualquer forma fiz-me à estrada, não sem antes ter parado num excelente restaurante italiano para almoçar a pensar que provavelmente iria enfrentar mais uns dias sem uma refeição decente.
O GPS tem um problema de regulação que tenho estado a tentar resolver mas que ainda me manda muitas vezes dar “a volta ao bilhar grande” antes de chegar ao destino. Desta vez programei-o para me guiar até à vila da doca e ele, felizmente, mandou-me para uma zona montanhosa mais a norte.
Quando fui a Ubud o italiano do Hotel de Bali tinha-me dito que não poderia deixar de visitar um lago fabuloso que existe na cratera de um velho vulcão extinto, ao estilo da nossa “lagoa das sete cidades” nos Açores que é daquelas paisagens que, quando vemos pela primeira vez do alto da montanha, ficamos de boca aberta de espanto pela beleza natural do local.
Pois desta vez o GPS mandou-me para a zona montanhosa junto ao lago Danau Batur. Quando lá cheguei acima, já depois de ter percebido a volta que estava a dar e de ter apanhado mais uma enorme chuvada, com ruas inundadas pelo caminho, vi um letreiro a indicar “Lake View Hotel”. Lembrei-me então da recomendação do italiano e, como já eram quase seis da tarde e estava um nevoeiro que não permitia ver lago nenhum, decidi por ali ficar. O Hotel estava vazio, ao ponto de ter passado aquele final de tarde a jogar “snooker” com a menina da recepção.
No dia seguinte, quando acordei e olhei para a vista pela janela do quarto, conclui que foi uma óptima ideia ter por ali ficado. O Hotel tinha uma situação fabulosa no alto da montanha, com vista deslumbrante sobre o lago. Estava uma manhã linda de sol e tomei o pequeno almoço no terraço superior a regalar os olhos com aquela paisagem fantástica.
Desci depois a serra por uma estrada muito sinuosa mas linda deste interior de Bali, com muita vegetação nas margens e, a certa altura, uma vista espetacular do alto da montanha para a costa com muitas palmeiras e um mar salpicado de pequenas ilhas.
Já no porto um polícia de alfandega perguntou-me onde ia e quando lhe respondi disse: “então talvez fosse boa ideia eu ver os documentos da moto”. É coisa que não me pedem nem nas fronteiras e não fazia ideia onde os tinha metido. O que vale é que quando ele percebeu que eu tinha que abrir e vasculhar várias malas disse: “deixe lá, deixe lá. Pode seguir”.
No barco para Lombok, a próxima ilha a oriente, numa travessia de mais de quatro horas, houve dois rapazes simpáticos que meteram conversa e combinámos que seguiria depois a moto deles para me indicarem um Hotel onde ficar. Pelo caminho pararam numa grande rotunda para se encontrarem com outros amigos, uma situação muito comum aqui. Os miúdos estacionam as “scooters” junto ao passeio central das rotundas e ficam à conversa, sentados nas rotundas. Quando não são rotundas são pontes. Sempre que há uma ponte sobre um qualquer rio vemos várias “scooters”, quando não são dezenas, estacionadas com miúdos à conversa.
Um dos rapazes pediu a um amigo para ir comprar à esquina umas maçarocas de milho e uma bebida à base de leite de coco misturado com um pouco de limão, leite e açúcar, que eles servem em pequenos sacos de plástico com gelo. Corta-se um canto do saco de plástico e bebemos por ali. Foi aquele o meu almoço e estava óptimo.
Estes rapazes recomendaram-me visitar uma pequena ilha próxima, Gili Trawangan que segundo eles era uma “free Island”.
- “O que querem dizer com isso de free Island”?
- “É uma ilha em que não há polícia e por isso pode-se fumar erva ou cheirar coca à vontade que ninguém diz nada. Cada um faz o que quer mas funciona tudo muito bem e não há crime porque é uma comunidade pequena e, se alguém se porta mal é simplesmente corrido da ilha. Não há veículos motorizados e só se pode circular de bicicleta ou a cavalo”.
Achei graça e no dia seguinte fui à procura de um barco que me levasse a Gili Trawangan.

13 de dezembro de 2014

Bali




A ilha de Bali, para quem está à espera de praias paradisíacas desilude bastante. É uma ilha vulcânica e por isso as praias são de areia escura, pouco atrativa. A que chamam “double six” perto do pequeno Hotel onde fiquei e onde fui no dia em que cheguei, era grande em extensão mas de areia dura e escura. Ao fim da tarde enchia-se de locais a jogarem futebol e os bares, frequentados por bifalhada de classe media tinham música ao vivo de fraca qualidade. Uma chungaria pouco atrativa.
A capital, Denpasar, é de ruas estreitas muito movimentadas com milhares de “scooters” e carros a provocarem enormes engarrafamentos pelo meio de muitas lojas e restaurantes virados para estes turistas do tipo que vemos em Albufeira no verão.
A situação melhora muito na parte sul da ilha. Aqui, uma pequena ilha que não tinha origem vulcânica foi ligada à principal através de um istmo. Esta zona, muito mais calma, já tem praias de areia clara, embora poucas. Curiosamente, sendo de longe as melhores praias de Bali, têm pouca gente e pessoas com muito melhor aspecto. Muitos deles são miúdos que vêm para o surf e de facto o local é um verdadeiro paraíso de surf.
Uma das praias a que fui formava uma esquerda de dois metros que parecia feita de propósito, com os bons surfistas a fazerem tubos fabulosos.
Depois, para além das praias há vários “spots” de surf onde não existe areia mas apenas rochas só que no mar as rochas que se estendem mar dentro provocam ondas ideais para o surf. Assim amontoam-se estas centenas de praticantes que andam de “spot” em “spot” nas suas “scooters” equipadas com um suporte lateral para as pranchas. É um ambiente giro.
Outra praia que visitei tinha umas cabanas em colmo  na areia que eram restaurantes e locais onde alugavam pranchas com um ar muito “tropical cool”.
Isto, sim, é o que eu verdadeiramente esperava de Bali. Mas resume-se a três ou quatro praias.
O que mais me encantou acabou por ser o interior da ilha, principalmente uma vila também turística mas com muito melhor ambiente que a capital. Chama-se Ubud e tem restaurantes e lojas com bom aspecto, templos Hindus, uma “Monkey Forest”, cheia de macacos e campos de arroz nos arredores. Muita vegetação formando uma paisagem natural deslumbrante que se encaixa bem nos templos e Palácio do antigo Sultão. Não há gente a mais e o ambiente é giro.
Um museu particular, com quadros pouco interessantes, alberga uma impressionante coleção de espadas e punhais.
Talvez a única vantagem de visitar estes locais mais turísticos é a qualidade dos Hoteis e restaurantes. Em Bali consegui comer um excelente bife, o que não me acontecia desde que saí de Portugal, há mais de dois meses.
Fiquei quatro dias num pequeno Hotel que tinha um quarto óptimo e limpo, com uma decoração simples mas gira e a particularidade de a casa de banho, bem arranjada, ser enorme e ao ar livre. Ou seja, a parte do duche e banheira não tinham teto. Já tinha tomado muitas vezes duche ao ar livre mas agora foi a primeira vez que tomei um duche à chuva, ou seja, um chuveiro quase do tamanho da casa de banho.
O Hotel pertencia a um simpático italiano casado com uma indonésia que, no dia em que tinha lá dois amigos também italianos a jantar me convidou. Fez uma esparguetada do melhor e acabámos a noite a provar uma aguardente Balinense que ele dizia tem causado muitos problemas na ilha por haver gente a morrer depois de beberem a que é mal feita mas aquela era de confiança, segundo ele, fabricada por uns amigos especialistas do Norte da ilha. Pelo menos no dia seguinte estávamos os quatro vivos e de boa saúde.
Este hotel tem à porta uma lavandaria que é explorada pelo mesmo casal com duas empregadas que, de cada vez que me viam sair na moto me faziam milhares de recomendações, visivelmente preocupadas em verem o que consideravam um velho maluco numa moto com tamanho desadequado à capacidade física do condutor. Eu dizia-lhes sempre que sim e mais também e lá seguia viagem.
No outro dia, estavam as duas e a patroa à porta quando saí e me fizeram as recomendações habituais, quais mães preocupadas.
Quando vou a arrancar, enquanto lhes respondia automaticamente que não havia qualquer problema, distraí-me, passei com a roda da frente por cima de uma grande pedra, desequilibrei-me e ... “catrapum”, moto no chão. Elas vieram as três a correr ajudar-me a levantar a moto e pude ler na cara das três: “como é que este tótó chegou até aqui, não nos entra na cabeça”.

11 de dezembro de 2014

Lumajang



Depois do dia passado de volta do vulcão, com todas as peripécias para lá chegar, fiquei numa pequena cidade de província, no que parecia ser o único hotel na vizinhança. A menina da recepção ficou radiante por ver chegar um cliente e quando voltei para lhe pedir uma toalha e um sabonete desfez-se em desculpas dando mesmo a sensação que não tinham um cliente faz tempo. Perguntei-lhe se tinham restaurante e voltou a rir-se muito para me dizer que não.
Onde posso encontrar um restaurante para jantar?
Não há
Não há um restaurante na cidade?
Não.
Recorri à internet.
No “Booking” anunciavam um único restaurante em Lumajang e sugeriam que fosse o primeiro a deixar um comentário no site deles sobre o estabelecimento.
Perguntei onde era o Warung Apung.
Ah, sim. Pois é. Há esse. Fica a uns três ou quarto quilómetros de aqui.
Fui até lá. Estava desarrumado. Parecia ter havido ali uma festa qualquer no dia anterior e ainda não tinham posto a casa em ordem. Havia muitos insectos a passearem por chão e paredes. Pedi a ementa. Vinha, obviamente só em Indonésio mas tinha algumas fotografias. Olhei para a que tinha melhor aspecto e tentei que me explicassem o que era mas nenhum dos empregados falava uma palavra de Inglês. Fizeram-me sinal que era uma boa escolha. Em menos de cinco minutos, como é costume nestes países asiáticos, trouxeram-me um prato que tinha lulas e legumes. Estava intragável com as lulas mais duras que uma borracha escolar mas, com um almoço que se tinha resumido a quatro pequenas bananas não tive outro remédio senão come-las sem me queixar.
No dia seguinte parti a caminho do “ferry” que me levaria a Bali. A estrada, com muitas partes de montanha, continua muito movimentada até porque esta é a única via que os camiões utilizam para abastecer as ilhas para oriente de Java com produtos que vêm da capital e do seu porto marítimo. Os camiões aqui são relativamente pequenos, para poderem circular nestas estreitas estradas e portanto têm que ser em quantidade. Como Java é a região do planeta com mais densidade populacional e deve existir uma “scooter” por família, imaginem a confusão.
Tinha ideia que Bali era uma ilha relativamente pequena, com cerca de 30 ou 40 Km de comprimento mas, mal saí do barco vi um sinal que tirou as minhas dúvidas. Indicava a distancia para Denpasar, a capital da ilha: 128 Km
Ao ritmo de para arranca a que se circula aqui isso representam três horas de caminho de maneira que, pelas seis da tarde, quando ficou noite, tratei de procurar um Hotel onde ficar.  Encontrei um que era um centro de yoga e fui recebido por uma senhora que falava muito devagar e transmitia uma calma que condizia com o espaço, bem decorado, em colmo e palha e com estátuas Hindus e Budistas. Muitas vezes as duas religiões misturam-se um pouco. O quarto, também em madeira forrada a palhinha, com o teto esconso e cama com docel coberta por uma rede mosquiteira, tinha a casa de banho ao ar livre e as próprias paredes não chegavam até cima, fazendo-nos entrar no ambiente da floresta que o rodeava, com os barulhos de pássaros e macacos que já tinha visto na beira da estrada pouco depois de desembarcar.
Outro pormenor que nos salta à vista é que em Bali voltamos a ver cães vadios, animais que não existem normalmente em países muçulmanos mas que havia em quantidade na Tailândia. Embora a Indonésia seja um país maioritariamente muçulmano, Bali é um caso à parte, com a maioria da população a ser Hindu.

8 de dezembro de 2014

Mount Bromo




Dia difícil mas sensacional.
Felizmente acordei cedo e saí do Hotel em Malang ainda antes das nove. A ideia para o dia era visitar um vulcão a cerca de 50 Km da cidade e depois seguir até Lumajang, a caminho de Bali. O Mount Bromo esteve em erupção há três anos e continua a fumegar.
Comecei por subir uma estreita estrada de montanha até à entrada da zona de reserva natural onde se situa o vulcão. Um dos guardas, com ar de pouco convencido, perguntou se eu pretendia ir até à zona do vulcão com aquela moto. “Sim. Porque não?”
“Humm. Não me parece”.
Uns quilómetros mais à frente nova paragem junto a uma cabana de outros guardas.
“Acho que não vai conseguir passar com essa moto”
“Mas vejo jipes a passarem para baixo”
“Sim, os jipes passam”
“Então esta também haverá de passar”
Descarreguei as malas junto à cabana e arranquei por uma estreita estrada de terra em muito mau estado que descia até um árido planalto. Até aqui tudo bem e esta era a parte que eles achavam que eu dificilmente conseguiria passar com a “Cross Tourer”.
Lá em baixo o trajeto a caminho do vulcão era por umas pistas em areia vulcânica onde a “Cross Tourer” começou a escorregar muito mas lá ia andando. Estes pneus que montei em Singapura já vi que são excelentes em estrada seca ou molhada e bons em mau piso duro mas em lama ou areia têm muito pouca aderência.
Fui andando devagar pela pista de areia marcada  com fitas, como no TT, até que comecei a apanhar muita areia solta. Aí a frente ficou muito difícil de controlar e acabei por cair contra um barranco. A moto, encostada ao barranco, não ficou completamente deitada mas tinha uma inclinação suficiente para eu não a conseguir levantar sozinho. Sem ninguém por perto desliguei a ignição e limitei-me a esperar, até que, passados uns dez minutos, apareceu um homem de pano aos quadrados enrolado à volta da cara e cabeça que parecia tirado do Sahara só que aqui, em vez de vir montado num camelo vinha numa “scooter” que, sem qualquer problema, atravessava a zona de areia. O “leão do deserto”, que trazia um carregamento de ervas na traseira, lá me ajudou a levantar a moto e avisou que mais à frente o piso estava pior de maneira que decidi voltar para trás, até porque se começasse a chover teria muita dificuldade em enfrentar a ultima subida muito esburacada. De volta à base onde tinha as malas contratei então o meu salvador para me levar à pendura da “scooter” ver o vulcão. E assim foi. Percorremos os dois na “scooter” aquela meia dúzia de quilómetros através de um deserto de areia de lava até à base do vulcão onde a muita areia solta não deixava nem a “scooter” passar.
Aluguei então um cavalo a um homem que por ali estava com o qual fui até cerca de cem metros do topo. Aí, uns degraus cavados na montanha permitem-nos chegar à orla da cratera. É de facto impressionante. Embora sem atividade o vulcão continua a libertar um fumo intoxicante com um forte cheiro a enxofre que não nos deixa estar ali muito tempo. Apenas o necessário para fazer um pequeno filme e tirar meia dúzia de fotografias.
Pelos mesmos meios voltei à “Cross Tourer” e parti então em direção à cidade de Lumajang. O trajeto é maioritariamente pela principal estrada que atravessa a ilha de Java de Ocidente para Oriente que tem apenas uma faixa para cada lado, com um alcatrão razoável mas em alguns locais muito remendado e com muito transito, aqui já de bastantes camiões e milhares de pequenas motos e “scooters”.
As estradas na Indonésia são muito ao estilo do que eram as portuguesas nos anos sessenta. Nesta zona era particularmente sinuosa, quase toda feita entre segunda e quarta velocidades.

1 de dezembro de 2014

Yogyakarta




Quando deixei a cidade, passei no famoso Prambanan Temple, que fica uns 18 Km para oriente, na direção em que depois pretendia seguir. Só que, para apanhar a estrada principal à saída do Templo o GPS, como muita vez o faz, obrigou-me a dar voltas e voltinhas por estreitas ruas secundárias, muitas delas cheias de transito, de maneira que me atrasei bastante. Da parte da tarde apanhei depois uma fantástica estrada através da montanha que, felizmente, não tinha muito transito e deu-me imenso gozo o passeio que variava entre bom e mau piso e estradas mais ou menos sinuosas. Voltava a utilizar a sexta velocidade que até ali tinha engrenado apenas uma meia dúzia de vezes desde que entrara no país, tal é o congestionamento usual das estradas na Indonésia, principalmente nesta ilha de Java.
Só que, quando circulava em sexta a uns 110 Km/h apanhei uma lomba inesperada, a moto levantou voo e quando aterrou a mala do lado esquerdo, que tem um dos apoios partidos desde os desastres na Índia, saltou fora e foi a arrastar umas boas dezenas de metros pelo alcatrão. Felizmente não se estragou mais do que estava. Voltei a colocá-la no sítio a arranquei. O passeio estava maravilhoso mas começou a anoitecer e não me aparecia um hotel à frente. Também não tinha comido mais nada depois do pequeno almoço porque aqui, ao contrário da maioria dos países, não se encontram bancas de fruta na estrada.
Procurei numa cidade um pouco maior por onde passei mas o único hotel ainda estava em construção. No GPS indicava o mais próximo a cerca de 30 Km de maneira que fui à procura desse já noite dentro. O problema foi que o trajeto  era uma sinuosa estrada de montanha onde a chuva tinha arrastado lama para o alcatrão e, para piorar a situação, a chuva regressava. Percorri estes 30 Km com noite cerrada e muita escorregadela na lama, mesmo a baixa velocidade.
Por fim lá cheguei a um Hotel de fraca qualidade mas que tinha um duche quente e uma galinha com massa para o jantar que até nem estava nada má. No supermercado do outro lado da rua encontrei um gelado para sobremesa.
Nesta zona central da ilha de Java há muito pouco turismo e é raro encontrar quem fale inglês. Neste hotel de província ninguém “arranhava” sequer de maneira que, para o pequeno almoço do dia seguinte, depois de verificar que não tinham pão, tive que me contentar com o que me deram, ou seja um caldo de carne com bocados de carne dentro e batatas fritas de pacote partidas, a boiarem.
Arranquei depois pela mesma estrada secundaria que ali me tinha levado e que, em algumas zonas, passava junto à costa. O estado do piso variava bastante ao longo do percurso mas de um modo geral era uma estrada que deu gozo fazer e tinha uma bonita paisagem à volta. Às tantas, do alto da montanha, vi uma praia lá em baixo. Dei lá um salto. Estava deserta e a manhã de sol linda de maneira que aproveitei para tomar um banho nu. Quando voltava à estrada encontrei um sinal que indicava uma reserva de tartarugas e dei lá um salto. Um homem informou-me que as recolhiam em pequenas para as entregarem ao mar em adultas mas só vi cerca de uma dúzia de bebés tartaruga e três animais já com uns 50 cm de comprimento.
Pelas três da tarde parei junto a um homem com uma banca de estrada que vendia uns frutos do tamanho de ananases pequenos mas em que a casca é de picos. Pedi para me abrir um e comi aqueles bocados de polpa com caroços no meio que odiei mas serviram de almoço. Apanhei depois a minha dose diária de chuvada forte e, pelas cinco da tarde, cheguei a Malang, uma cidade agradável por conservar uma temperatura mais moderada, influenciada por ventos marítimos e outros vindos das altas montanhas dos arredores e com um centro onde os jardins públicos estão bem tratados.
Na manhã seguinte fui visitar um mercado de pássaros onde, curiosamente, tingem os pintos de várias cores, para os tornarem mais atraentes, calculo, e um outro de flores. Dei uma volta pela cidade, almocei no Toko Oen ao som do Frank Sinatra e vim beber um café a um Hotel onde tinha ontem vindo jantar, vizinho daquele onde estou instalado e que tem uma decoração fantástica com peças antigas fabulosas. O Tugu Hotel é mesmo considerado por alguns guias turísticos como o principal museu da cidade. Adorei o Hotel e embora estivesse fora do meu orçamento para lá ficar instalado, voltei a jantar lá.

28 de novembro de 2014

Dieng Plateau




Preocupada com a minha saúde a minha filha tinha-me mandado uma mensagem a dizer que se eu não fosse imediatamente a um medico me vinha cá buscar por uma orelha.
Assim, antes de deixar Purwokerto procurei no GPS uma farmácia e dei lá um salto. Sentia-me bastante melhor embora ainda tivesse a garganta inflamada.
O que eles chamam farmácia é um mini Mercado onde também vendem alguns remédios mas fiquei com a sensação que a maioria da população ainda se trata por métodos tradicionais ancestrais.
Quando com dificuldade expliquei à menina da farmácia, que não falava uma palavra de inglês, que me doía a garganta recomendou-me uma embalagem de um liquido espesso, embalado num saco de papel, tipo shampoo de hotel barato, verde e com sabor a hortelã. Segui as recomendações da menina, bebendo aquilo junto com um pouco de água e realmente penso que me fez bem.
Arranquei depois a caminho de Dieng Plateau, um planalto que fica a 2000 metros de altura e a 150 Km de ali. Parei para almoçar quando começou a chover com mais intensidade, num “self service” onde a única coisa que consegui escolher foi arroz branco e uma carne estofada não sei bem de que animal mas que estava ainda dentro do taxo com água a ferver. Por cima da vitrine com os vários pratos expostos, compostos na sua maioria por fritos de proveniência duvidosa, estavam vários cartões destes que atraem as moscas e elas ficam lá agarradas, carregados de vítimas.
Cheguei a Dieng Plateau com os últimos 40 Km através de uma fantástica estrada de montanha rodeada de densa vegetação e instalei-me num dos hoteis de fraca qualidade aqui existentes, pelas quatro da tarde.
Quando estava a tirar a mala da moto apareceram dois irmãos suíços, dos seus 30 anos, chegados em duas “scooters” alugadas em Yogyakarta, a cidade que previa visitar no dia seguinte. Estivemos um bocado à conversa e acabámos depois por ir jantar juntos. O mais velho vive na Indonésia há quatro anos, tendo por cá casado e aberto um restaurante.
Na manhã seguinte acordei relativamente cedo e fui visitar as atrações de Dieng Plateau, duas crateras de vulcão, perto uma da outra mas totalmente distintas. Uma está extinta e alberga um grande lago com uma água azul turquesa que dá uma boa imagem enquanto a outra tem alguma atividade com água a borbulhar e muito fumo a sair da cratera, obrigando-nos a utilizar máscaras de papel para nos aproximarmos do local.
Desci depois do planalto por uma estreita e movimentada estrada com muita inclinação, que nos leva a baixar dos 2000 metros para pouco mais de 100 em poucas dezenas de quilómetros e apanhei a seguir uma estrada linda, com muita vegetação dos dois lados que me levou até perto de Borobudur.
Parei para visitar o fantástico templo budista e fui ficar a Yogyakarta, 40 Km depois.
No dia seguinte voltei a fazer de turista e visitei o Palácio do Sultão onde apenas podemos ver a parte não habitada pois o atual  Sultão, cuja posição é hereditária, embora só possa passar para filhos varões, ainda governa a cidade e vive no Palácio, com uma grande família que inclui não só mulher e filhos (já não podem ser polígamos, coitados) mas também irmãos, cunhados e sobrinhos, num total de mais de cem pessoas. O que já não é utilizado pela família são os banhos, uma zona com duas piscinas e vários outros espaços que agora está aberta a visitas do publico e tem a curiosidade de ter sido restaurada há dez anos com um subsídio da Fundação Gulbenkian.
O guia que me mostrou o Palácio do Sultão falou-me, a meu pedido, um pouco mais sobre a situação religiosa na Indonésia. O país, disse-me ele, não tem uma religião oficial mas a maioria da população é muçulmana, tal como os membros do governo. Existe uma certa liberdade religiosa mas nem todas as religiões são aceites. São-no algumas facções do Cristianismo, e a mulher dele era católica, sendo ele muçulmano, assim como o Budismo e o Hinduísmo.
Na prática nunca vi tanta atividade nas mesquitas como aqui. Talvez para se afirmarem em relação às outras religiões chamam para as rezas matinais através dos seus altifalantes por volta das quatro da manhã, cerca de uma hora antes do nascer do sol, numa “conversa” que dura cerca de 15 minutos e que faz com que toda a vizinhança acorde, como me tem acontecido sempre que o Hotel onde fico é perto de uma das muitas mesquitas. O processo repete-se à hora do almoço e com o pôr do sol, o que se torna uma imposição quase insuportável para os não muçulmanos. O meu amigo suíço foi obrigado a mudar da primeira casa onde se tinha instalado porque a filha pequena também acordava e se assustava com a chamada para as rezas de uma mesquita vizinha.
Assisti ao mesmo problema no sul da Tailândia, região onde a maioria da população é Muçulmana, e é interessante verificar como a calma dos Budistas os leva a aceitarem a situação sem se queixarem.

26 de novembro de 2014

Tarikamalaya



Saí pelas 11 da manhã de Cimpancek e duas horas depois estava a entrar em Bandung, que é uma cidade agradável, com árvores nas ruas e um aspecto mais arrumado que Jakarta. O principal atrativo da cidade não o era para mim que ligo pouco a roupas. É que tem dezenas de lojas de “Stock off” com restos de coleções das grandes marcas, muitas delas fabricadas na Indonésia indo ali parar as sobras, com as etiquetas cortadas mas originais a uma fracção do preço europeu. Ainda entrei numa e comprei uma camisola para o meu filho.
No dia seguinte saí do hotel já perto do meio dia e, antes de deixar a cidade, ainda fui visitar o Museu Giologi que parece interessantíssimo mas infelizmente só tem os textos de explicação dos fenómenos Geológicos e sobre os produtos extraídos da terra, como metais, petróleo ou carvão, em Indonésio.
Arranquei de Bandung pela uma da tarde e teria passado pouco mais de meia hora quando uma chuvada forte se abateu sobre a estrada. Parei debaixo de um telheiro de uma oficina onde já estavam duas “scooters” também a fugirem da chuva. Voltei a arrancar vinte minutos depois quando o tempo melhorou um pouco mas viajei o resto do dia sempre debaixo de chuva. Numa das vilas por onde passei havia enormes cheias e parei para filmar um pouco as “scooter” a atravessarem aquele aguaceiro e “cortarem” a água como se fossem barcos.
Ali a vida não para quando chove.
Nesta parte central da ilha o transito melhora um pouco mas as médias continuam a ser muito baixas, com várias paragens e as “scooters” a passarem-me razias, em ambos os sentidos, de cada vez que passa a fluir menos. Esta é a principal estrada que atravessa a ilha de ocidente para oriente mas só tem uma via em cada sentido e é muito sinuosa de maneira que as ultrapassagens a que assisto são assustadoras. Quando estava parado junto a uma passagem de nível uma mulher que vinha numa “scooter”, com uma burca a fazer de capacete, como é comum, não conseguiu travar a tempo a bateu-me na traseira, quase me fazendo cair, mas não disse uma palavra ou fez qualquer sinal, simplesmente “furou” caminho e pôs-se à minha frente. Não resisti depois a passar-lhe uma razia, qual criança amuada, ao dobro da velocidade a que seguia.
Nesse dia comecei a sentir falta de força nas pernas e um cansaço maior que o habitual. Pensei que seria do frenesim do transito e parei numa pequena cidade a pouco mais de cem quilómetros de Bandung pelas quatro da tarde.
Só no dia seguinte percebi que estava com uma enorme gripe, certamente causada pelas chuvadas que tenho apanhado.
Durante o dia ainda percorri 170 Km até Baturraden, na montanha, mas à noite senti enormes arrepios de frio quando a temperatura andava a mais de 20º e na manhã seguinte não estava em estado de voltar à estrada, de maneira que fiquei um dia sem sair do Hotel e dormi a manhã toda.
24 horas fechado num Hotel onde me parecia ser o único cliente e com refeições que se assemelhavam às de um hospital de província levou-me a sair à rua no dia seguinte, mesmo se ainda não me sentia completamente curado da gripe.
Subi a montanha e entrei num parque natural por uma estreita estrada rodeada de densa vegetação. Fui ver uma fonte de água quente que sai de umas rochas a mais de 50º e corre depois para uma cascata cujas paredes ganharam diferentes tons de castanho e verde com a passagem desta água vulcânica. O vapor que sai daquela água envolve a paisagem da floresta, dando-lhe um ar misterioso.
Sentei-me num banco junto à passagem da água e um homem fez-me uma massagem aos pés com argila proveniente daquelas águas, que dizem faz muito bem à pele. Depois de massajar uma das minha pernas e pé com aquela argila virou-se para a cliente Indonésia que estava sentada ao meu lado e disse: “veja a diferença na cor das pernas dele. Antes e depois”. Pela conversa parecia estar a sugerir que eu estaria com os pés sujos quando ali cheguei.
Antes de sair do Hotel, situado numa vila já na montanha, tinha perguntado ao homem da recepção se haveria por ali uma farmácia ao que ele olhou para mim como se não fizesse a mínima ideia de que tipo de estabelecimento estaria eu a falar, de maneira que quando saí da fonte de água quente, almocei num restaurante da montanha e desci depois até à cidade cá em baixo. 

24 de novembro de 2014

Cikampek



Arranquei perto do meio dia com a ideia de fazer tranquilamente os 150 Km que me separavam de Bandung até às quatro ou cinco da tarde.
Só que não previ a loucura que é sair de Jakarta sem poder entrar na auto estrada pois as motos estão proibidas de as usar na Indonésia. É que esta ilha de Java que, não sendo a maior é a mais populosa, tem 140.000 Km2 ou seja, um tamanho de cerca de uma vez e meia a área de Portugal e nada menos que 135 milhões de habitantes que parecem ter cada um uma “scooter” ou moto de 125 c.c.
É a loucura total. Passadas duas horas de um para arranca entre milhares de motos e carros, debaixo de uma temperatura de 38º, com uma humidade altíssima e níveis de poluição assustadores, comecei a sentir as mesmas tonturas que tinha tido uma vez na Índia que acho se devem a uma baixa tensão. Parei para descansar uma meia hora durante a qual bebi um litro de água e fiquei novo.
Pelo caminho apanhei, por sorte, a feira de antiguidades da Jalan Surabaya que é fantástica. Um dos comerciantes, enquanto me mostrava um maravilhoso escafandro, réplica dos utilizados pela marinha Norte americana durante a segunda grande guerra, cotava-me que já tinha tido a visita dos Clinton’s e de Mick Jaeger, por mais que uma vez.
Tinha deixado a feira há pouco quando um miúdo numa 125 meteu conversa nuns sinais luminosos. Perguntou-me de onde vinha e quando lhe disse Portugal ficou espantado por eu vir sozinho: “Alone? Crazy, crazy”.
Achei graça ao miúdo e quando nos sinais seguintes me perguntou se não queria ir até casa dele que era ali perto, imaginei uma mãe a cozinhar um almoço maravilhoso e disse-lhe que sim. O miúdo dos seus vinte anos foi então à minha frente a afastar o transito em sinais com as mãos e pernas, tanto o que vinha no nosso sentido como em sentido contrário, qual policia motorizado.
Levou-me por umas ruas estreitas até um beco onde vivia. Entrámos então numa barraca com três pequenas divisões onde morava com um casal amigo. Na primeira divisão estavam uma moto e uma scooter meia desmontadas e com peças amontoadas no meio de muita tralha. A divisão seguinte era o quarto onde dormia o casal amigo com um colchão no chão, lençóis revoltos com ar muito sujo, vários cinzeiros cheios de beatas e papéis e lixo à volta. Não teria mais de dois metros por três e o único sítio sem ser o colchão do casal onde alguém se pudesse sentar era uma almofada onde descansava um rafeiro, com três meses de idade, a quem tinha caído o pelo quase todo e que os amigos do rapaz disseram ter sido causado por uma alergia. A miúda da casa deu uma limpeza rápida no cubículo, que consistiu em levar os cinzeiros lá para fora e amontoar a um canto papéis e lixo e ficámos os quatro ali em pé à conversa, pois a divisão seguinte era a cozinha que calculo fosse também quarto do rapaz e onde não me atrevi a entrar.
Ofereceram-me café mas disse que tinha acabado de beber muita água e tinha que voltar à estrada para tentar chegar ainda de dia a Bandung.
Depois de uma sessão fotográfica na barraca e junto à moto lá consegui arrancar, novamente guiado por este amigo com vocação para polícia de transito a quem desta vez recomendei que não mandasse afastar os outros carros do meu caminho pois dava muito nas vistas.
Voltei ao inferno do transito Indonésio onde não se vêm tantos camiões como na Índia mas muitas mais motos que parecem um enxame de abelhas a atacar quem lhes foi ao mel.
Só tinha tomado o pequeno almoço às dez da manhã mas durante o dia não passei por nenhum restaurante com aspecto minimamente limpo onde me apetecesse almoçar de maneira que às cinco da tarde começou a chover e decidi  parar numa destas tascas de beira de estrada. Um simpático velho disse-me que pusesse a moto abrigada da chuva quase dentro da tasca e a mulher veio perguntar o que queria. Em cima da mesa tinham uns peixes e outros fritos com aspecto de terem passado pela frigideira há mais de um mês de maneira que lhe pedi quatro bananas que vi a um canto e um chá que me soube maravilhosamente.
Quando arranquei estava a ficar noite e ainda faltavam 80 Km para Bandung que com aquele transito e estradas esburacadas era coisa para me levar a fazer em duas horas de maneira que, ao cheguei à próxima cidade, Cikampek, procurei um Hotel no GPS que me encaminhou para o único existente na zona. Não é dos piores onde tenho ficado e o pessoal é simpático.