18 de dezembro de 2015

Yeppoon


Para o segundo dia que fiquei em Airlie Beach tinha reservado um passeio num velho barco à vela que incluía irmos até Whitsunday Island, onde existe uma das praias mais famosas e fabulosas do mundo, Whithaven Beach. A praia, de uma areia muito fina e branca, faz uns recortes que formam uma espécie de lagoas com diferentes tons de azul turquesa, conforme a profundidade. A vista do alto da ilha é, simplesmente, deslumbrante.
Estivemos na praia umas duas horas e voltamos a bordo para almoçar. De tarde fomos fazer “snorkling” para uma ilha perto. Fazendo aquelas ilhas parte do Great Barrier Reef a fauna marítima e, principalmente, os corais, são fabulosos com variações de cores e texturas constantes.
Neste passeio conheci uma escocesa giríssima, tatuada nos braços e pernas e com nariz, orelhas e boca atravessados por  piercings. Uma viagem fantástica no velho veleiro que começou às sete e meia da manhã e só acabou com o pôr do sol, à seis e meia da tarde. Inesquecível.
Deixei Airlie Beach pelas dez horas da manhã seguinte. Um Australiano que conheci no acampamento recomendou-me Yeppoon, a pouco mais de quinhentos quilómetros de distancia e foi para aí que vim.
O parque de campismo é fantástico porque se estende ao longo de uma estreita faixa costeira mesmo em cima da praia. Aqui já não há as alforrecas que têm aterrorizado o norte do país e mal acordei tomei um banho de mar fantástico. Depois do pequeno almoço ainda fiz uma máquina de roupa (não é assim que elas dizem?) antes de partir conhecer a zona. Fui visitar umas grutas que não eram nada de especial e parti para almoçar numa vila mais a Sul que é um parque natural, Emu Park, com enormes praias rasas onde a maré avança uma boa centena de metros.
No dia seguinte acordei cedo e, ainda não eram sete da manhã já estava a dar um mergulho na praia. Parti depois a caminho de Seventeen Seventy, a pouco mais de 200 Km. Já lá perto parei para almoçar num típico pub Australiano onde os clientes estão ao bar de chapéu de abas largas. Era numa pequena vila e alguns dos homens vieram perguntar-me de onde era a matricula da moto e desejar-me boa viagem. Aqui na Australia ligam pouco à moto e muitos, quando lhes digo que vim de Portugal, não acreditam.
Respondem: “pois, está bem. Aqui na Australia começou onde?”

14 de dezembro de 2015

Airlie Beach


Em Cowley Beach fui parar a um “camping” de fraca qualidade, numa praia quase ao abandono mas em que a senhora era simpática.
Quando perguntei se tinha wi-fi riu-se. “Nãao. Aqui não se apanha nada disso” Ela fez o preço na hora e perguntou-me:
- “o que acha de 10 dólares ?”
- “acho bem”.
Até as maquinas de lavar a roupa levavam só 3 dólares em vez dos habituais 4.
Aqueci qualquer coisa que levava comigo mas quando estava a meio do jantar começou a chover e lembrei-me que tinha a roupa a secar. Parecia uma dona de casa atarantada a correr recolher a roupa com o jantar a arrefecer.
 No dia seguinte fiz a mala com a roupa húmida e arranquei pelas nove e meia.
Percorri perto de 500 Km e cheguei a Airlie Beach, que tem um ambiente fantástico. Uma vila pequena mas com muito comércio, casas e apartamentos com bom aspecto, junto ao mar e nada menos que três marinas repletas de barcos de todos os tamanhos e feitios. Não espanta. Ali à volta há um grupo fabuloso de ilhas e o famoso Great Coral Reef.
Montei a “barraca” no bem organizado “camping” local. O espaço reservado aos “unpowered”, aqueles que não têm roulottes ou autocaravanas para ligar à eletricidade, era em terra com muitas árvores repletas de pássaros. Durante a noite ouvia uma ou outra discussão entre eles mas, a partir das cinco da manhã, quando nascia o sol, era um regabofe pegado. Um barulheira de conversas cruzadas com muitos piares distintos. Alguns pareciam estar a rir-se às gargalhadas, qual grupo de jovens a contarem as aventuras da noite anterior. Apetecia sair da tenda e gritar para a copa das árvores: “shut the fuck up. There are people trying to sleep, here”.
No primeiro dia que por ali fiquei comecei por dar um mergulho na boa e pouco concorrida piscina do parque,  onde fiquei a ler um pouco. Fui depois até à praia, onde tinham uma zona protegida por redes contra tubarões e, principalmente, para reterem as tais alforrecas assassinas.
Pela hora de almoço peguei na moto e fui visitar uma praia cerca de cinquenta quilómetros a Norte. É estranho como há zonas que estão bem exploradas turisticamente e outras, muito perto, quase abandonadas. Dingo Beach está como a terão deixado há décadas atrás, com casas de fraca qualidade e quase deserta. Um pequeno barco à venda na rua com ar de ninguém lhe pegar e um café restaurante onde o dono fez uma cara de perturbado quando lhe disse que queria comer qualquer coisa e me mandou falar com a mulher que me acabou por vender um pequeno filete em cima de um monte de batatas fritas oleosas por 15 dólares. O homem tinha entretanto abandonado o bar para se sentar ele a almoçar num canto de restaurante mas a senhora lá acabou por vir também ao bar tirar-me a cerveja.
A seguir ao almoço fiquei por ali a ler e dei um passeio a pé pela praia onde não se podia tomar banho pois a rede protetora estava  desfeita e podre.

13 de dezembro de 2015

Cowley Beach




Choveu muito durante a noite mas dormi bem. Quando estava a sair, pelas dez e meia da manhã, já voltava a americana da sua exploração matinal aos lagartos.
- “Vais já hoje embora? Nããão”.
Arranquei com um dia cinzento a caminho de Millaa Millaa onde me disseram haver umas cascatas fantásticas. De facto, num espaço de quinze quilómetros visitei três cascatas, duas delas fabulosas.
Parti depois em direção à costa, já a sul de Cairns. Fui primeiro até Mission Beach, onde almocei um hamburger excelente num café muito giro junto à praia e depois passei em Etty Bay, onde me tinham dito que havia um "camping" junto à praia muito simpático. Afinal tinha muita pouca graça e a dona não era muito simpática de maneira que decidi não ficar.
Ali havia pessoas a tomar banho no mar mas numa zona protegida por uma rede, provavelmente não só para tubarões mas também para estas alforrecas venenosas que são o terror do momento e matam mais que tubarões.
As pessoas, de um modo geral, são muito simpáticas aqui na Australia. Fazem um pouco lembrar-me a primeira vez que entrei num bar em Nova Iorque. A mulher virou-se para mim e disse efusivamente: “Olá, como é que você está hoje?”  e eu pensei: está a confundir-me com alguém. Só depois vi que tratava da mesma forma toda a gente que passasse aquela porta. Aqui é a mesma coisa. Todas falam como se nos conhecessem lindamente. Ontem num supermercado até fiquei atrapalhado com a maneira como a menina da caixa me disse aquilo com uma voz sexy e olhos nos olhos. Pensei, bolas, se tratas assim todos os clientes deve ser um desassossego. Quando estava a pagar já estava a convidá-la para vir dar um mergulho ao lago e ela a dizer-me que tinha lá estado essa manhã e a água estava optima.
Os homens que encontramos na rua aqui pela província também falam quase sempre: “Hi, mate. How are you today?”
Ficamos com a sensação de um “easy going” da maioria da população. Eles no fundo vivem bem, de um modo geral, e não devem ter muitas preocupações.
Nas vilas e cidades costeiras, até em Sydney, é curioso ver bastante gente descalça, homens, mulheres e principalmente crianças. Quando têm entre cinco e oito anos andam quase sempre descalços pela rua, mesmo quando a mãe que as acompanha usa sapatos ou havaianas.
No entanto já vi vários restaurantes, que nunca são muito sofisticados, com letreiros à porta a dizerem: “No shoes, no shirt, no food”.

12 de dezembro de 2015

Cairns - 2


Saí do “camping” só por volta das onze horas e decidi dar um passeio pela região, através das fantásticas estradas de montanha por entre a floresta. Fui visitar uma velha cidade mineira, onde a simpática mulher do centro de informações, quando lhe disse que era português, me contou que fazia parte do grupo que, em Melbourne, contestou a ocupação indonésia de Timor. Organizavam manifestações e eram muito ativas. Disse-me que todas as mulheres do grupo, que na altura teriam vinte e poucos anos, estavam fascinadas com o Xanana Gusmão. “Ele a lutar no mato”, dizia-me ela com um ar encantado. “E casou com uma australiana”, acrescentou.
Da parte da tarde fiz um corta mato por uma estrada de terra através de campos verdes, numa paisagem que podia ser austríaca, para ir ver o lago Eacham, que se formou numa cratera de vulcão e onde bastante gente aproveita para dar uns mergulhos, mesmo com este tempo chuvoso, pois a água é morna.
Instalei-me num pequeno “camping” muito giro por ter muitas árvores e ser inclinado até um lago em baixo.
Junto a esse lago estava montada uma tenda grande em lona verde tropa com duas cadeiras de pano à porta, deixadas à chuva, que parecia de um explorador africano. Encontrei-me com a miúda que a ocupava quando preparávamos os nossos jantares na cozinha do “camping”. Uma americana, divertida, que ficou fascinada quando lhe disse que tinha vindo de moto de Portugal. “that’s cool”.
Estava ali a viver sozinha há um mês, a fazer um estudo para a Universidade sobre uns lagartos que há junto ao lago.
A noite prometia chuva e frio e a velhota dona do “camping”, muito simpática, veio oferecer-nos cobertores e almofadas.

11 de dezembro de 2015

Cairns



Quando arranquei de manhã comecei logo por rodar numa zona muito diferente da Australia daquela onde tinha passado os últimos oito dias. Aqui, já a cerca de 200 Km de Cairns, na costa oriental Norte, começam a aparecer pequenas vilas a cada 30 ou 40 Km, há movimento nas estradas e pessoas de um lado para o outro, mesmo tendo em conta que a Australia não é um país muito populoso.
Passei por pequenas vilas muito bem arranjadas, com flores nos espaços públicos, a relva cortada e comercio e pequenos hotéis com bom aspecto.
À volta de Cairns existe uma floresta tropical ou “rain forest” como eles lhe chamam, e toda a zona é muito verde, nalguns locais até junto da costa.
Apanhei uma estrada de montanha através da floresta fabulosa. 70 Km de curvas e contra curvas em bom piso que me deram imenso gozo.
Entrei depois na cidade de Cairns e fui até à zona das praias. Visitei as várias que há a Norte da cidade e quando parei num parque de campismo junto a uma das praias, a simpática mulher que me atendeu deu-me um mapa com todos os locais de interesse na região. Almocei por ali num excelente “fish and chips” (filete de barra) e como ainda era cedo, segui viagem para Norte, até Port Douglas e dali até Mossman, onde aproveitei para ir visitar Mossman Gorge, uma zona de um rio na floresta  onde se forma uma lagoa com uma pequena queda de água e onde algumas pessoas aproveitam para tomar banho, à falta de o poderem fazer no mar. É que entre Outubro e Março aparecem por aqui umas pequena alforrecas venenosas que matam mesmo, de maneira que os poucos que se atrevem a mergulhar no mar vão equipados com fatos de borracha.
Pelas cinco da tarde acabei por me instalar num simpático “camping” junto a uma das praias.
Aqui na Australia há parques de campismo por todo o lado e as pessoas utilizam muito o sistema, seja com tendas ou autocaravanas, devido ao preço exorbitante dos hotéis.
Além disso, em muitas zonas não só há mais parques de campismo que Hoteis, como os parques, por terem pouca construção, têm direito a ocupar espaços muito melhores que os Hoteis, muitas das vezes em cima de praias, rios ou lagos.

9 de dezembro de 2015

Mount Garnet



Estava estafado depois da grande etapa do dia anterior. Às nove da noite enfiei-me dentro do saco cama a ler e meia hora depois apaguei a luz e adormeci. Acordei às seis da manhã, fresco que nem uma alface. Antes de arrumar as coisas peguei na moto e fui para a porta de um pub onde tinha estado na tarde anterior com acesso à internet. Sentei-me na escada cá de fora, pois ainda estava fechado, e liguei o computador. Uma hora depois voltei ao acampamento arrumar a tralha e tomar um duche e o pequeno almoço. Arranquei pelas dez da manhã, como de costume.
Ao longo do dia e à medida que me aproximava mais do oceano, a temperatura foi ficando mais agradável e parei para almoçar numa pequena cidade já com um ar civilizado, Charters Towers.
Queria ir a Cairns, na costa mas mais a norte do ponto em que estava e em vez de escolher ir direito à costa e apanhar uma estrada que iria mais tarde percorrer em sentido inverso, preferi rumar a norte pelo interior. Era mais uma vez uma estrada muito isolada e 200 Km depois de sair de Charters Towers, onde pensava existir uma pequena cidade, o local não era mais que um posto de abastecimento muito básico, com um parque de campismo sinistro. Perguntei onde era a próxima vila e disseram-me ficar a cerca de 160 Km de maneira que, embora já tarde para mim, porque evito o mais possível andar de noite, arranquei para Mount Garnet.
A minha teoria sobre a hora dos cangurus saírem para a estrada confirmou-se quando, ao final da tarde, comecei a ver primeiro dois cangurus na berma da estrada,  mãe e filho, com ar de quem hesitava, com medo de serem atropelados e, mais à frente, três adultos aos saltos a atravessarem a estrada. Aqui percebi porque são tantas vezes atropelados. É que eles dão saltos grandes e, não olham para ver se vêm carros ou motos, simplesmente saltam da berma para o meio da estrada. Foi 100 metros à minha frente e por isso não corri o risco de os atropelar mas, ao constatar que era aquela hora que eles saíam à rua fui o resto do trajeto com enorme atenção, até porque a vegetação começava a ser bastante mais densa.
Cheguei a Mount Garnet já ao cair da noite e acabei por montar a tenda com muito pouca luz.

5 de dezembro de 2015

Julia Creek



Arranquei de Camooweal pelas dez da manhã, depois de comprar a habitual garrafa de água matinal no supermercado junto ao parque de campismo. O transito aumentou um pouco aqui em Queensland. Continua a ser muito escasso mas a cada cem quilómetros já me cruzo com meia dúzia de carros e três ou quatro “road trains”, estes camiões gigantes. Desde que saí de Darwin ainda não vi uma única moto. Talvez devido às altas temperaturas, que nesta altura do ano rondam os 40º, as pessoas preferem deslocar-se de carro com ar condicionado.
Pelo caminho passei por uma cidade maior, Mount Isa e estava à espera que o transito aumentasse significativamente a partir daí mas, muito pouco. Também não se vêm autocarros e comboios só de mercadorias. Penso que as pessoas que vivem nestas vilas maiores saem pouco para fora.
Parei para almoçar e comi um bife horrível. Acho que ainda não tive uma refeição decente desde que estou na Australia. Mesmo em Sydney é difícil.
Depois do almoço o termómetro da moto marcava 44º, um record nesta viagem.
Depois de deixar os parques tenho percorrido cerca de 500 Km por dia através deste quase deserto em rumo à costa.
Neste dia fui até Julia Creek, mais uma pequena vila perdida no meio do nada. Os parques de campismo não costumam ter ligação à internet e desta vez safei-me, primeiro no centro de Informações, sem movimento aparente, e depois na Biblioteca local.
De Julia Creek até Richmond são cerca de 130 Km de duas ou três retas traçadas através de uma planície de erva seca muito rasteira, a perder de vista. Nesta pouco mais de centena de quilómetros passei por centenas de cadáveres de cangurus atropelados, em diversos estados de decomposição, alguns que terão morrido nas ultimas 24 horas. Ninguém os recolhe e acabam por ser devorados por aves de rapina, cobras e outros animais. O incrível é que não vi nenhum canguru a atravessar a estrada ou sequer vivo na beira da estrada. Calculo que estes atropelamentos se devem dar ao final da tarde e à noite, quando está um pouco menos de calor e eles sairão a procurar alimento.