A minha grande
curiosidade em visitar o Butão era, para além das normais visitas a templos e
museus e de me maravilhar com a exuberante paisagem dos Himalayas sem neve, de
que já tinha tido um fantástico exemplo no Nepal, tentar perceber qual o
segredo para aquela gente conseguir ser, como dizem “a população mais feliz do
planeta”. Ontem, no transito, já tinha percebido que eles cumprem as regras mas
isso só por si não torna ninguém feliz, antes pelo contrario.
Li extractos de
discursos de alguns dos últimos reis do Butão. Sim, é uma monarquia, desde que
o país existe como tal, o início do século passado. Curiosamente nestes
discursos os reis nunca falam em inflação, crise, desemprego ou outras
desgraças que afligem os países ditos civilizados. Os discursos dos reis
referem sempre as coisas boas que vão acontecendo no país, que nunca esteve em
guerra desde que o primeiro rei conseguiu unificar o território, e dizem que a
ambição deles é que a população viva cada vez mais feliz. Nunca referem mais
próspera ou com menores dificuldades financeiras. Simplesmente, mais feliz.
O Butão é um
pequeno país, com cerca de metade do tamanho de Portugal, todo ele nos
Himalayas e com menos de 700.000 habitantes.
À medida que
rodava país dentro ia-me apercebendo de razões que podem influenciar essa
felicidade de que tanto se fala. 1º ponto importante, ela não vem do dinheiro.
A maioria da população vive com muito pouco dinheiro. Muito menos que os
portugueses, por exemplo. E sentimos logo no primeiro contacto com esta gente
que estão muito mais felizes, de um modo geral, do que quem vive no Dubai, a
destrocar petrodólares ou em Londres, Paris ou Nova Iorque. Não há psicólogos
ou psiquiatras mas apenas Monges Budistas e “Great Lamas”.
Mas como dizia, a
primeira razão palpável desta felicidade é que saímos da confusão e sujidade da
Índia e entramos diretamente nos Himalayas que formam como que uma fronteira
natural no sul do país. Passados três quilómetros já estamos com uma paisagem
deslumbrante à nossa frente de enormes montanhas forradas a verde, com muito
pouco transito e sem lixo nas ruas. Eu que nem era de lá já me estava a sentir
mais feliz por ali estar. A principal estrada de entrada no país, como todas as
outras é estreita, por vezes em mau estado e entrelaçada nos Himalayas como se
estivesse a eles abraçada. Precipícios de um lado, montanha que abate do outro,
camiões que não se conseguem cruzar sem saírem os dois para as respectivas
bermas seria uma situação complicada em qualquer outro lugar. Ali faz parte e
ninguém se queixa, hipnotizado que está por aquela calma transmitida pelo ar
das montanhas que nos faz respirar mais devagar.
Constatei o
estado de espírito da população logo no transito da montanha em que tanto
carros como camiões, quando percebiam que vinha uma moto atrás mais rápida que
eles, encostavam na berma e faziam sinal para eu passar. Mais tarde, confirmei
essa mentalidade generalizada quando a polícia nos mandou parar a dizer que
teríamos de esperar cerca de hora e meia por estarem a reparar a estrada. Formou-se
uma enorme fila de carros, carrinhas e camiões que foram sendo desviados para um
largo onde havia um pequeno restaurante à beira da estrada. Não ouvi uma única
pessoa a queixar-se ou a dizer que estava atrasada para seja o que for. Para
eles o tempo não é importante e estarem ali parados ou a caminho do que tinham
para fazer parecia ser exatamente a mesma coisa. Mais espantado fiquei quando,
passada uma hora, outro polícia veio anunciar que teríamos que esperar mais
duas porque a estrada que estavam a arranjar tinha abatido montanha abaixo. E
não há outra estrada de chegada à capital por aquele lado do país. Aquela gente
recebeu a notícia com o ar mais natural do mundo e limitaram-se a esperar
calmamente. Não estavam a conter uma fúria interior mas simplesmente não se
sentiam afectados pelo que nem sequer consideravam um problema. Este estado de
espírito sim, certamente faz parte do estudo para obtenção do diploma da
felicidade.
Outra curiosidade
deste povo é a maneira de se vestirem. A maior parte dos homens anda de saias,
que são mesmo obrigatórias para quem trabalha para o estado, enquanto as
mulheres que se vêm na rua vestem quase todas calças, independentemente das
suas preferências sexuais.
Ao contrário do
Nepal que, por ser a terra Natal do Buda, teria mais razões para ser um país
maioritariamente budista mas onde a população é quase toda Indhu, aqui 95% são
Budistas. Para eles há só um Deus, o mesmo de todas as religiões. Acredito que
este estado de espírito do povo do Butão se deve muito à calma e meditação
incentivadas pela religião Budista que todos seguem e que lhes é incutida desde
miúdos na escola. As crianças são ensinadas a meditar nas escolas e em vez da
ginástica comum, praticam yoga.
Neste primeiro
dia fiquei na cidade de Paro, a segunda do país. Comecei por ir ver, ao longe,
o extraordinário mosteiro “Tigers Nest” cravado na escarpa da montanha a várias
centenas de metros de altura. Aqui, onde agora vivem monges, terá estado o
segundo Buda quando, no século VIII chegou à região.
Fui depois
visitar um templo Budista para perceber um pouco o que lá se passa. Um grupo de
uns 30 monges estava a acabar uma cerimónia a que infelizmente não me deixaram
assistir, nem a mim nem ao meu guia que não sendo monge é Budista. Sentia-se
que era uma cerimónia importante e eram dirigidos por um “Great Lama” ou mestre
Budista. Vi-o sair do recinto, com um homem que faz de guarda ao chefe e vai
batendo um chicote no chão na frente do caminho. A acompanharem o “Great Lama”
ou “Rimpoche” vêm ainda dois monges e um militar fardado e de espingarda ao
ombro, não vá o guarda do chicote ter dificuldades em cumprir a sua missão,
mesmo se tanto militar como espingarda tinham ar de nunca terem disparado um
tiro. Todo este folclore, que se destinava simplesmente à caminhada do “Great
Lama” do Templo para a casa que ocupava na ocasião, no terreno adjacente, como
na maior parte dos casos de deslocações de pessoas importantes por todo o
mundo, é mais para marcar a importância do personagem que para ter um efeito
prático de proteção.
Os monges
recolheram a uma espécie de camarata do outro lado do Templo.
Fiquei num Hotel
simples mas limpo onde me serviram um excelente jantar.
Já estou mais Zen só de ler este texto. Espero que ande a tirar muitas fotografias, quem sabe para ilustrar um novo livro.
ResponderEliminarE como está a temperatura?
Ana
bela crónica, estamos mais conhecedores do reino do Butão.
ResponderEliminarHélder Galante
A 2ª foto é do jogo do botão????
ResponderEliminarHélder Galante
Que país espetacular, simples e eficaz. continuação de boa viagem Sande e Castro e obrigado pelas exelentes crónicas que nos vai deixando aqui, invejo a sua experiencia!
ResponderEliminarAndré Rodrigues
Pus aquela fotografia por achar que define o estado de espirito da população nas coisas mais simples como aquele jogo com uma espécie de botões, sim. A outra rapariga que lá estava, quando percebeu que eu estava perdido, disse logo para eu usar o telemóvel dela.
ResponderEliminar