Hoje de manhã saí
daquele Hotel de aldeia já a suar, mesmo depois do habitual duche frio matinal.
Fora da zona montanhosa as temperaturas, nesta altura do ano, sobem até muito
perto dos 40º. Continuei na mesma estrada que, ao aproximar-se da fronteira com
a Índia, começava a ter muito movimento e, consequentemente, estava mais
degradada mas nada com o que se possa comparar ao que encontrei mais tarde.
Passei a
fronteira sem grandes problemas deixando para trás o Nepal que me seduziu, não
pela confusão de Katmandu mas pelas gentes das aldeias de província, pela
paisagem fabulosa e pela reserva animal que visitei com o divertido safari de
elefante.
As pessoas são
mais civilizadas que no norte da Índia, de um modo geral mais cultas e menos
deslumbradas com a moto, por exemplo. Claro que paravam para ver mas perguntavam-me
a cilindrada e não o preço, quanto atingia de velocidade e não quanto gastava.
Por outro lado
não ligavam tanto Portugal aos jogadores de futebol, como em outros países (não
na Índia que aí só têm olhos para o cricket) mas muitos sabiam onde ficava e
vários me falaram em Lisboa, mesmo nunca tendo saído do seu país. Interessante
também foi observar bastante gente da
classe media deles, como empregados de hotel, a jogarem xadrez.
Mas estava eu a
passar a fronteira de regresso à Índia. Não há confusão possível, entro na
bagunça mais à séria, principalmente porque a população por quilómetro quadrado
é muito superior à do Nepal e logo, o lixo, o transito, os buracos na estrada e
tudo o mais é a multiplicar. Até conseguir chegar a uma estrada em que se
pudesse circular a mais de 20, 30 Km/h entre “rickshaws”, carroças, bicicletas,
motos, vacas, etc. demorei mais de meia hora. Depois, quando pensava que iria
percorrer os 200 Km que me separavam da fronteira com o Butão tranquilamente, apanhei
120 Km da pior estrada que alguma vez vi na vida. Foram 120 Km de buracos
contínuos numa estrada que já foi de alcatrão mas agora é só terra e, mesmo
numa prova de todo-o-terreno, seria considerada de muito mau piso. Indiscritível.
Para agravar a situação, centenas de camiões a circularem nos dois sentidos e a
ultrapassarem-se a 30 Km/h faziam daquela via um verdadeiro inferno, que se
arrastou a tarde toda. Por duas vezes fui quase ao chão, apanhado de surpresa
por enormes buracos quando seguia atrás de camiões e não os via. E não era
possível afastar-me mais porque logo outro me ultrapassava. Outra vez, quando
ia a passar um o condutor decidiu ultrapassar um outro e, como não têm
retrovisores e ainda não me habituei à ideia de ir sempre a tocar a buzina,
atirou-me para fora da estrada. Na berma, em terra inclinada, tive que travar
forte para não passar por cima de um pastor deitado tranquilamente no meio
daquela poeirada indiscritível.
Quando começou a
ficar noite parei no que me pareceu poder ser um Hotel mas era a quinta duma
simpática família que me disseram logo para descansar um pouco e a irmã que se
vê na fotografia foi buscar-me um chá e uma tosta que me souberam divinalmente.
Convidaram-me para ficar a jantar mas não pude aceitar pois queria encontrar um
hotel antes de anoitecer.
Parei na cidade
seguinte. Foi o segundo inferno do dia. O melhor hotel desta cidade de
província era tão ou pior que os piores que tenho encontrado. Só que aqui
estava na Índia, numa cidade de província com uma população muito assinalável.
Resultado: tive a sensação que toda a população tinha parado para vir ver a
moto. Às tantas o gerente veio sugerir-me que a enfiasse num corredor que dava
acesso ao Hotel e que, embora fosse aberto para a rua sempre era mais escondido.
Não solucionou o problema. Começou a entrar gente e mais gente pelo corredor a
querer ver a moto e subiam para o hotel para me verem a mim. O gerente mandou
pôr uma capa por cima da moto mas tudo parecia que ainda os entusiasmava mais.
Fechei-me no quarto e às tantas o homem veio chamar-me para a deslocar mais
para a frente que estava a causar um pandemónio na entrada do Hotel. Quando lá
cheguei abaixo assustei-me com a multidão.
Fui jantar ao
restaurante do Hotel e os poucos clientes que tinham acesso ao local ficaram
embasbacados a ver-me jantar. Dois deles, com as mesas quase todas livres,
sentaram-se na mesa mesmo à minha frente os dois virados para mim. Passado um
bocado o gerente do Hotel veio chamar-me porque tinha o chefe da polícia ao
telefone. Perguntou-me quem eu era, o que se passava, de onde vinha e quando
partia e qual a razão daquela confusão na cidade. Finalmente perguntou se
precisava que mandasse alguém ou se queria guardar a moto na esquadra mas
recusei ambas as soluções por me parecer que iriam agravar a situação.
Já tinha fugido
para o quarto outra vez quando me bateram à porta. Quando abri entraram-me três
pessoas pelo quarto dentro e outras 20 também queriam entrar. Um homem que me
mostrou um cartão de jornalista disse que trabalhava para um jornal e televisão
locais e queria entrevistar-me. Parecia que estava naquele filme do Woody Allen
em que fabricam uma estrela sem qualquer razão e não a largam. Pedi para saírem
e que já iria ter com ele ao restaurante mas com o máximo de mais três pessoas.
Lá fui conceder a entrevista e depois pedir à multidão que se afastasse para
tirarmos uma fotografias junto à moto. O homem agradeceu muito eu ter-lhe dado
15 minutos do meu tempo e que estava emocionado por ter estado a falar comigo.
Tal qual o filme do Woody Allen. Ainda pensei que aparecesse alguém a dizer:
“isto foi para os apanhados” antes de voltar a fugir para o quarto. O gerente
garantiu-me que às onze horas fechavam as entradas para o corredor. Espero que
a moto ainda tenha as peças todas amanhã.
É por estas e por outras que a India não me atrai. Claro que eu, ao contrário do que se passa consigo, passaria completamente despercebida no meio da multidão e não seria esta estrela de Bollywood em que o Francisco se está a tornar.
ResponderEliminarEspero que a moto esteja direitiinha de manhã que mandar peças para aí não deve ser nada fácil.
Boa viagem.
Ana
ahahahahaha
ResponderEliminarA fama do Francisco já chegou bem longe... a continuar assim ainda tem que arranjar uns batedores, para abrirem caminho e fazer-lhe segurança...Boa viagem.
ResponderEliminarHelder Galante