20 de maio de 2019

Senegal

De Bissau até à fronteira do Senegal são cerca de 120 Km de uma estrada alcatroada mas em mau estado, com muitos buracos. Depois, numa distancia de uns 200 Km passamos por nada menos que seis postos fronteiriços.
Começa por ser a saída da Guiné-Bissau e entrada no Senegal para uns 150 Km depois, já em boa estrada, passarmos do Senegal para a Gâmbia, que naquele ponto não tem mais de 20 ou 30 Km de largura. Saímos depois da Gâmbia para voltarmos a entrar no Senegal. 
Em todos os seis postos tive que carimbar Passaporte e Carnet, mesmo para percorrer as poucas dezenas de quilómetros na Gâmbia. Pelo meio passamos uma nova ponte sobre o rio Gamble, que até há pouco tinha que ser atravessado de barcaça.
As estradas no Senegal são boas. Fui direito a Dakar porque pretendia mudar o óleo à moto pois em Bissau não encontrara óleo específico para moto. Além disso precisava de um novo pneu para trás. O que montara em Cabinda já não chegaria a Portugal.
Uns cem quilómetros antes de entrar na cidade procurei onde ficar pois, com a passagem dos seis postos fronteiriços atrasara-me e anoitecera. Pelo GPS encontrei uma pequena estalagem com boa classificação e barata. Era cómoda, junto à praia, e conheci um simpático casal francês  que estava com duas filhas miúdas e com quem jantei e tomei o pequeno almoço do dia seguinte.
Parti para Dakar pelas onze da manhã e fui direito à oficina do Rafa, a única que trabalha com motos de grande cilindrada em Dakar. Ele tinha um óleo sintético 10-60, uma graduação que desconhecia, feita para aguentar as altas temperaturas africanas. Arranjou-me também um pneu italiano barato  pois os das marcas mais comuns ali custam o dobro do preço europeu.
Saí da parte da tarde rumo ao Norte acabando por ficar na cidade senegalesa de Saint Louis.
O Hotel era simpático e estava a decorrer uma semana de Jazz na cidade, com concertos de rua. Nunca fui grande entusiasta de Jazz mas gostei muito dos concertos de rua a que assisti nos dias que estive em New Orleans. Assim, essa noite, fui ao concerto da americana Indra Rios Moore, na praça principal.
O trajecto até à fronteira de Marrocos no Sahara Ocidental é, a partir de ali, por uma estrada perto da costa por cerca de 800 Km, que depois segue através do deserto até Agadir por mais 1.500 Km.

Já tinha ouvido falar no inferno que é a fronteira de Rosso entre o Senegal e a Mauritânia mas nunca imaginei tamanho pesadelo.
Ainda do lado do Senegal vários homens que se intitulam oficiais alfandegários enchem-nos a cabeça a dizerem que tratam de tudo mas são relativamente fáceis de despachar e senti um alívio quando entrei com a moto no pequeno ferry que faz a travessia do rio Senegal rumo à Mauritânia. Na outra margem, mal desembarco com a moto, vários homens abordaram-me a pedir o Passaporte. Fui recusando entregá-lo até que um guarda fardado me disse:
- Tem que me entregar o Passaporte. Sou funcionário da Alfandega.
Entreguei-lhe o Passaporte e teve início o pesadelo. Ele passou-o para um dos outros homens dizendo que o outro também era oficial e iria tratar das burocracias. Este segundo homem, que se fazia passar por oficial mas mais tarde constatei ser um simples popular com autorização dos guardas para extorquir dinheiro a turistas, tentava a todo o custo convencer-me que era funcionário da alfandega e, em certas ocasiões, levou-me a acreditar nele. Por exemplo quando entrou num gabinete a dizer que uma das secretárias vagas era a sua e o guarda que estava na outra não o negou. Ou quando eu me queixei que um dos guardas me extorquiu dinheiro para carimbar o Carnet, colocando a nota directamente numa gaveta cheia de dinheiro sem me passar qualquer recibo e ele concordou comigo e disse que lá ía pedir o dinheiro de volta e me entregou uma nota idêntica.
Enquanto eu tratava do visto o homem apareceu-me com o bilhete do barco pago e outro de uma taxa comunitária, pedindo-me o dinheiro, por mais que eu lhe dissesse que queria tratar dos papeis sozinho. Constatei depois que o bilhete do barco estava inflacionado 10 vezes.
Às tantas corri com ele de vez pois tinha chamado um suposto homem de seguros que me pedia uma fortuna pelo seguro obrigatório.
Passei três horas naquele inferno e quando passei o portão, o homem e dois amigos faziam-me uma espera para exigir que lhe devolvesse o dinheiro que me tinha dado e que, segundo ele não o tinha pedido ao oficial que o extorquira. Não tive outro remédio senão pagar-lhe e fugir daquela vila, com medo de voltar a ser assaltado.
O problema é que a próxima cidade, Nouakchott, era a 200 Km mas o GPS indicava 5 horas para a percorrer e, normalmente, não se engana.
Eram seis da tarde quando deixei a fronteira e em pouco mais de uma hora ficou noite. A estrada que de início era alcatroada passou a estrada de terra muito degradada com partes em areia mole em que por vezes tinha que andar em primeira velocidade. Foi um martírio que só acabou às onze da noite.

Chegado a Nouakchott o GPS atrapalhou-se com a morada do Hotel que havia marcado e mandou-me para dentro de uma favela. Aquela hora da noite vi a vida a andar para trás mas decidi parar, reprogramar o GPS e arrancar para fora dali.


3 comentários:

  1. E além do mais, sózinho.
    Repete comigo, não se viaja sózinho, nem no Bazão quanto mais no resto do mundo.
    Bjs, Ana

    ResponderEliminar
  2. Que ansiedade pelo desfecho... :)
    Todos dias procuro desenvolvimentos... :)
    Quando se lê algo interessante é assim !
    Obrigado Francisco por nos fazer viajar

    ResponderEliminar