6 de novembro de 2016

Redwoods


Quando deixei South Lake Tahoe percorri as margens do lago pelo lado Ocidental até ao Norte. A Estrada, estando elevada em relação ao lago em parte do trajeto, tem paisagens de cortar a respiração, com a floresta de Sequoias a descer da montanha até às margens do lago e, mais à frente, uma baía, Eagles Bay, com uma pequena ilha no meio. Soberbo.
A partir do Norte do Lake Tahoe segui para Ocidente. A minha ideia era voltar a apanhar a costa da Califórnia mas desta vez por cima de S. Francisco para subir até Seattle, no estado de Oregon, antes de atravessar o país para a costa Oriental.
Nesse dia fiquei na pequena vila de Colusa e no dia seguinte, em vez de continuar na mesma direção a caminho da costa decidi subir cento e tal quilómetros para Norte na Highway 5, sem grande graça, para então atravessar para Ocidente pelo meio de uma serra com uma floresta de árvores seculares, Redwoods.
Antes de entrar na serra, felizmente lembrei-me de atestar o depósito. Nessa altura começou a chover e não parou durante as quatro horas seguintes. Entrei na estrada da serra já debaixo de chuva intensa. A temperatura foi baixando até aos 8º. O fato é eficiente e protege-me do frio e da chuva mas as botas já estão em mau estado, e já fiz de sapateiro ao colar-lhes as solas por mais que uma vez. O resultado é que deixam passar água. Primeiro comecei a senti-la nos dedos dos pés para passada meia hora ter os pés totalmente ensopados. As luvas que utilizo agora, o terceiro jogo desde que parti de Portugal, também não são impermeáveis e, com as mãos também encharcadas, passado um tempo deixo de sentir o efeito dos punhos aquecidos. Enfim, estava muito desconfortável. Para agravar a situação apanhei uma zona de meia dúzia de quilómetros onde tinham passado a máquina para arrancar o alcatrão velho antes de colocar novo e essa parte ficou muito escorregadia. Passou uma, duas horas e não aparecia uma única casa ou abrigo onde pudesse parar um pouco a ver se a chuva passava. Pensei que haveria pelo menos uma ou outra bomba de gasolina no meio da serra mas, nada.
Às tantas vejo uma cabana, junto á estrada, com um letreiro luminoso dentro a dizer “open”. Sabia que não seria local onde pudesse ficar mas pelo menos para parar e beber qualquer coisa quente servia. Entrei no bar. Estavam dez homens lá dentro, nos seus trintas, todos de barbas. Uns a jogar snooker, outros ao balcão, junto com duas raparigas mal vestidas e com barretes de lã enfiados na cabeça. Outro grupo de três com mais uma rapariga, com o mesmo tipo de traje e aspecto, estavam à volta de uma pequena mesa com um grande jarro de cerveja já no fim. Todos eles pareciam lenhadores, incluindo as mulheres.
Calaram-se todos quando eu entrei. Os que jogavam pararam e ficou o grupo a olhar para mim como se de um extra terrestre se tratasse. Até que, o que parecia ser o chefe, abriu a boca: “Hello, how are you today?”. Todos relaxaram e voltaram às conversas, dando a sensação que acalmaram com o que podia ser uma ordem do género: ele é aceite aqui dentro.
Pousei o capacete e as luvas encharcadas em cima de um banco corrido e o blusão num dos dois bancos livres do balcão, sentando-me no outro. Do outro lado uma mulher grande e forte que fez um sorriso e perguntou o que eu queria.
- Um café, por favor?
Calaram-se todos outra vez e ficaram a olhar para mim como se tivesse encomendado uma chávena de ácido sulfúrico.
- Café?? Não sei se tenho. E a abrir a porta que dava para a cozinha gritou:
- Temos café? Ouviu-se uma voz de um homem lá de dentro:
- Acho que sim.
Um minuto depois pôs-me um balde de café à frente.
- Têm açúcar?
- Açucar? Como se eu estivesse a pedir outra coisa extraordinária. Trouxe-me um pacote que se parecia com os do leite com açúcar.
- Tem uma colher?
- Não.
- E um garfo, uma faca, qualquer coisa para mexer?
- Vou ver o que arranjo
Entrou na cozinha e voltou com um facalhão da cozinha na mão com uns quarenta centímetros de comprimento. Será que a grandalhona me iria estripar só por ter pedido um café?
- Esta serve? disse já com um sorriso.
- Sim.
Bebi o café tranquilamente no meio dos barbudos e daquelas raparigas encasacadas que partilhavam os jarros de cerveja e voltei para a chuva que não parava de cair.
Passou mais meia hora e comecei a ficar preocupado quando o indicador de gasolina desceu de um quarto de depósito. Passava um ou outro carro mas a pé não havia ninguém a quem perguntar quanto faltaria para acabar aquele inferno.
Finalmente uma bomba de gasolina. Fui pagar e perguntar onde estava. A uma hora da costa, responderam. Se não fosse aquela bomba não tinha gasolina para a percorrer.
Ao pôr gasolina uma miúda nova, gira mas borbulhenta, com um piercing na boca e roupas grossas que pareciam ter saído dos armários das que estavam no bar, tentava atestar o seu enorme Jipe Toyota sem conseguir. Pediu-me ajuda. Era simpática. Ficámos à conversa enquanto lhe atestava o Jipe.
- Realmente os estrangeiros dizem-me sempre que devia conhecer outros países porque eu só viajo nos Estados Unidos.
Depois de pagar veio despedir-se com um aperto de mão
- Tricia. Foi um prazer
- Francisco
- Tome cuidado. Eu nunca mais andei de moto desde que caí à pendura de um namorado.

2 comentários:

  1. E pronto, não há nada como umas miúdas para ir animando. Senão era só moto e paisagem. E que tal comprar umas botas?
    cuidado om o Trump e boa viagem.
    Bjs
    Ana

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    1. Parece que já ganhou. Eu estou agora em Tramp Land. Beijinhos

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