No Segundo dia que passei em Tokyo já não chovia. Tinha decidido ir
assistir a uma luta de Sumo e nesta altura do ano os lutadores profissionais só
treinam entre as 7,30 e as 10,30 da manhã. Levantei-me cedo e saí do Hotel às
oito mas decidi ir de metro, para mão me perder, até porque o local era muito
perto de uma estação. O metro à hora de ponta em Tokyo não é o caos que fazem
dele. Há obviamente muita gente a circular, até porque os japoneses usam muito
os transportes públicos. Só que os metro têm mais carruagens que qualquer outro
que vi até agora, a preencherem plataformas com mais de 200 metros de
comprimento, de maneira que vão cheios mas ninguém se atropela.
As lutas de Sumo são um espetáculo fascinante. Cada luta dura poucos segundos,
com os enormes e pesados lutadores a fazerem um show de preparação em que se
põem de cócoras e depois arrancam um contra o outro com uma força brutal. Ganha
quem atirar o outro ao chão ou o conseguir empurrar para fora do espaço
estabelecido. Eles são grandes e gordos mas também fortes.
O que tem graça é ver os miúdos, futuros lutadores, a verem os
profissionais porque a maioria, tal como 99% dos japoneses, não são nada gordos
e, estando ali, a estudarem para serem profissionais de Sumo, sabem que têm que
engordar, e muito. O Sumo tem também um pormenor que não se vê em qualquer
outro desporto. O vencedor não mostra uma grande felicidade nem faz espalhafato
nenhum quando ganha, para mostrar respeito pelo vencido. Além disso consideram
que o importante aqui não é vencer mas o esforço que se faz para tentar vencer.
Típico japonês.
Depois de assistir ao treino de Sumo fui ainda visitar um parque
fantástico. O
“Shinjuku Gyoen National Garden” parece não ter sido construído como um
jardim no meio da cidade, transmitindo antes a ideia que a maioria das árvores
e plantas são uma floresta que já lá estava antes da cidade crescer e ali foi
mantida. Árvores seculares, lagos e espaços com vários tipos de jardins, desde
o inglês ao francês, passando obviamente pelo japonês, tornam aquele parque
muito especial.
Deixei Tokyo por volta da uma da tarde e parti em direção a Nikko, cerca de
170 Km a Norte da capital.
A viagem decorreu sem sobressaltos mas quando ia a chegar a Nikko às tantas
vi um polícia numa scooter à minha frente e reduzi drasticamente a velocidade,
para não o ultrapassar, com medo de infringir os limites de velocidade que, em
muitas vilas e cidades, estão marcados no chão com um 40. Mas o homem ia tão
devagar que decidi passa-lo. Quando chagámos ao semáforo seguinte ele parou
atrás de mim e, pelo retrovisor vi-o tirar uma caneta de uma bolsa e escrever a
matricula da minha moto nas costas da mão. Deve ter gerado uma confusão naquela
esquadra.
Fui parar a uma estalagem familiar, no meio da floresta. O dono, um enorme
Nigeriano a falar um inglês perfeito, era casado com uma japonesa e tinham
quatro filhos pequenos. A estalagem tinha ar de anos sessenta. Uma enorme sala,
com um pé direito de sete ou oito metros, servia também de casa de jantar.
Junto corria um riacho com forte e barulhenta corrente mas que mal se via por
entre a densa vegetação. O homem propôs fazer jantar o que me evitou pegar na
moto de noite para ir à pequena vila procurar um restaurante que provavelmente
fecharia às oito e meia da noite. Fez uma fantástica galinha com um óptimo
molho, acompanhada de batatas cozidas em vez de arroz, a meu pedido e de um
casal de italianos que eram os dois outros únicos hóspedes, fartos que
estávamos todos de comer arroz.
Depois do jantar os italianos foram-se deitar assim como a japonesa e as
crianças e o Nigeriano trouxe uma garrafa de aguardente de batata e ficámos à
conversa. Ele estava nacionalizado inglês, tinha sido Marine e combatido nas
Faulkland, pouco, dizia ele. Depois voltou à Nigeria onde foi militar de alta
patente. Contou as extraordinárias histórias de corrupção e roubo que se passam
com os governos e militares africanos. Despediu-se da tropa a abriu um bar no
Hawai, onde conheceu esta japonesa.
Estávamos nesta conversa pelas dez e meia da noite quando o chão começou a
tremer forte e as janelas a abanarem como só me lembrava de ter assistido uma
noite em Portugal, teria eu uns 13 anos.
- O que é isto?
- Um tremor de terra, disse ele calmamente.
Durou uns 30 segundos.
- Mas isto é usual?
- Muito não mas de vez em quando acontece.
- Felizmente não foi dos grandes, disse eu.
- Pode ter sido grande noutro local do país.
No dia seguinte vi que foi ali perto e que atingiu 5.3 na escala de Richter,
sendo dos maiores do ano. Durante a noite,
felizmente, não houve réplicas.
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