23 de junho de 2018

Ibotirama

A greve dos camionistas continuava mas eu tinha esperança de conseguir gasolina nalguma bomba da estrada que, com menos movimento, ainda não a tivesse esgotado. Tinha mil quilómetros pela frente que inicialmente pensei fazer em dois dias mas, passados 250 Km de uma estrada praticamente deserta, cheguei a Ibotirama sem encontrar um posto com gasolina. Perguntei na cidade e estavam há dez dias sem gasolina nas bombas.
Almocei, procurei um Hotel barato e preparei-me psicológicamente para passar uns dias naquela pequena cidade sem graça nenhuma.
Mas o homem de uma das bombas tinha-me dado alguma esperança.
- O patrão diz que o camião talvez venha ao fim do dia.
Pelas oito da noite saí para jantar e, embora ainda não houvesse gasolina no posto, estava uma enorme fila à espera de um camião que chegaria.
Na praça principal estava uma mulher gorda, toda vestida de branco com um barrete branco a completar o traje, rodeada de reluzentes panelas fumegantes. Tinha melhor aspecto que todas as comidas de rua que vira antes pelo país e perguntei-lhe o que vendia.
- É um típico prato bahiano com camarão.
Pedi uma dose. O camarão, como é muito pequeno, come-se com casca e vem acompanhado de uma papa de algum legume local, batata doce e uma espécie de pão frito. Era bom embora a casca do camarão, mesmo fininha e estaladiça, não me tenha cativado.
Depois deste jantar de rua voltei à fila de gasolina quando o camião abastecedor acabara de chegar. Felizmente tinham formado uma fila de motos separada da dos carros e três quartos de hora depois tinha o depósito cheio. 
Na manhã seguinte já os camiões circulavam e havia algum transito na estrada. A manhã passou-se bem e felizmente consegui reabastecer antes do almoço porque, pouco depois, parei numa cidade onde a greve parecia estar para durar e a população, exaltada, exibia cartazes a pedir uma “intervenção militar imediata”. Alguns bêbados entraram no restaurante onde almoçava e uma troca de palavras menos medidas entre eles quase descambava em violência, a meio do meu frango com batatas. O empregado do mercado ao lado, grande, veio lá resolver o desacato e correr com os alcoolizados do restaurante. Arranquei dali já perto das quatro, sem reparar que a próxima cidade ainda estava longe. Quando me apercebi acelerei um pouco o ritmo, para não chegar de noite. Só que apanhei cem quilómetros de uma estrada muito traiçoeira, com buracos grandes no alcatrão, que podiam empenar uma jante ou rebentar um pneu se lhes acertava em cheio. Fui passando por cima de um ou outro quando já não me conseguia desviar deles e apenas tinha tempo de me levantar para absorver a pancada pois, para não perder tempo, não quis baixar dos 120 Km/h.  
Pensei em pedir guarida numa fazenda para passar a noite mas as estradas de terra que saíam da estrada principal tinham letreiros com o nome das Fazendas e a quilometragem para lá chegar, que nunca era inferior a 20 Km, embora as plantações se estendessem até à estrada alcatroada. Asim, não quis arriscar fazer 40 Km numa estrada de terra infrutiferamente, e fui seguindo viagem. Felizmente a ultima hora, parte já feita de noite, foi em boa estrada e, com plantações de cereais e algodão a perder de vista, não resisti a parar ao pôr do sol para tirar uma ou outra fotografia.
Fiquei na vila de São Domingos, junto ao lago que ali se forma com o rio do mesmo nome.
Jantei no quiosque em frente ao único Hotel da povoação e dormi que nem um anjo.

3 comentários:

  1. A que horas anoitece? Podia googlar mas é mais fácil perguntar-lhe
    Ana

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    1. Por volta das sete e meia, nesta altura. E aqui é um perigo andar à noite, não só por causa dos assaltos mas também pelos buracos que às vezes as estradas têm e onde cabe a moto inteira e pelos animais que se podem atravessar.

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  2. Cristiano Ferreira26 junho, 2018 11:34

    Essa foto da moto ao pôr do sol, está espectacular!
    Continuemos a viajar! :)

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