19 de fevereiro de 2017

Laredo


Saí de Worthon a caminho de Laredo, a cidade junto à fronteira do México onde iria deixar os Estados Unidos. Percorri neste país mais de 20.000 Km nos últimos três meses, atravessando 28 Estados de Norte a Sul, Este a Oeste. Gostei de o ficar a conhecer melhor que a grande maioria dos americanos. É realmente a maior democracia do mundo que só não é totalmente bem sucedida porque nunca houve nem haverá uma integração completa entre brancos, pretos, Índios, ou “native americans” como gostam de ser apelidados, e os chamados latinos, em que a maioria são Mexicanos.
O país tem sítios de uma beleza natural extraordinária, uma população bem adaptada ao seu tamanho, sem serem de mais nem de menos e a prova de que funciona é que a maioria dos mais de 300 milhões de habitantes pertencem a uma classe media com um poder de compra elevado, que tem um bom nível de vida, só estragado pelos maus hábitos alimentares. Têm uma industria e agricultura muito desenvolvidas sendo quase autossuficientes mas por terem uma densidade populacional relativamente baixa preocupam-se pouco com as questões ambientais, que afectam muito mais outros países e cidades superpopulosos.
As últimas centenas de quilómetros até Laredo são feitos numa estrada de longas rectas através de uma savana ao estilo Africano mas mais densa, com pouco movimento e sem construções ou bombas de gasolina. A poucas dezenas de quilómetros da cidade a polícia faz uma segunda inspeção aos carros que acabaram de entrar no país vindos do México, pois é uma das principais rotas da droga que entra nos Estados Unidos vinda da América Central e do Sul.
Laredo já tem um ambiente muito mexicano e a maioria da população vem do país vizinho. Na rua, bombas de gasolina e supermercados houve-se falar mais espanhol que inglês. Já na cidade reservei estadia no Motel 6, uma cadeia americana de baixa qualidade, através da Internet de um Hotel onde parei. Não sabia é que haviam três na cidade. Fui ao primeiro que encontrei  e enquanto tentava saber, com o rapaz da recepção, qual seria o Motel 6 em que tinha reserva, uma americana dos seus 40 anos, meia louca, acompanhada de um guarda costas Mexicano enorme, meteu conversa comigo enquanto retirava papéis amachucados da carteira que incluíam dezenas de “travel cheques”. Entre conselhos sobre o Hotel e o tipo de quarto onde eu deveria ficar queixava-se que o homem do banco não lhe tinha satisfeito uma qualquer pretensão e que ela se tinha virado para ele e respondido: “mas eu sou dona do banco”. O guarda costas  tinha ar de já não aguentar aturar a mulher por muito mais tempo, que acabou por arrancar e abandonar o telemóvel em cima do balcão, para ele voltar atrás   recolhe-lo cinco minutos depois.
Lá descobri em qual dos três Motel 6 tinha reservado quarto e arranquei, já de noite. Tinha comprado num supermercado um arroz com galinha em lata que foi o meu jantar, aquecido no micro ondas do Motel. Acordei às sete da manhã com um homem a entrar-me pelo quarto que, quando me viu dar um salto na cama, voltou a sair. Não adormeci outra vez e pouco depois acabei por me levantar e arrumar as coisas para passar a fronteira.
Quando, uns dias antes, passeava pelas ruas do French Quarter em New Orleans parei a ver as pinturas de um artista de rua que eram melhores que o costume. O homem meteu conversa comigo e quando lhe disse que ia para o México perguntou:
- “Leva uma pistola, certo”!?
- “Não”
- “E uma faca”?
- “Também não. Não me serviam de grande coisa porque acho que não     conseguiria dar um tiro ou uma facada em ninguém”.
- “Pois. Eu também não”, respondeu o homem. “Por isso não vou para esses sítios”.
O Norte do México é suposto ser perigoso devido aos gangs de droga que têm o mau hábito de raptar quem pensam poder render-lhes uns tostões. Quando estava nos Estados Unidos noticiaram que dois miúdos, que tinham decidido ir  fazer surf para as praias do Norte do Mexico, tinham sido mortos e os corpos queimados por um destes gangs. Por estas razões recomendaram-me que enchesse o depósito de gasolina nos Estados Unidos e, depois de passar a fronteira, só parasse 250 Km depois, em Monterrey.
Quando cheguei á fronteira americana disseram-me que para carimbar o Carnet (espécie de Passaporte da moto) teria que ir à fronteira onde passam os camiões, uns dez quilómetros para Ocidente. Fui até lá tratar dos papéis mas não me deixaram sair por ali com a moto e tive que regressar à primeira. Do lado Mexicano nem me mandaram parar dando a entender que todos os estrangeiros que vêm do lado americano são bem vindos, embora raros. A cidade de Laredo do lado Mexicano é uma vila com um ar sinistro. Ruas estreitas e sujas com casas descoloridas em mau estado. A população tem o ar sofrido de quem está resignado às agruras da vida. De vez em quando passo por “pick-ups” com jagunços na caixa de carga que têm o ar de ir a caminho de um tiroteio. Segui o conselho que me tinham dado, atravessei a vila e entrei na via rápida que nos leva a Monterrey. É uma estrada que começa em mau estado mas se transforma em auto estrada, com pouco movimento. Uns dez quilómetro depois um sugestivo sinal na beira da estrada indica: “fim da zona controlada pela polícia”, como quem afirma: a partir de aqui não nos responsabilizamos pelos problemas que possa ter.
Cheguei a Monterrey sem sobressaltos e, já perto da cidade, parei para pôr gasolina e aproveitei para almoçar no restaurante junto.

2 comentários:

  1. Boa tarde,

    Acabei agora de ler a sua aventura até ao momento, fantástico o seu percurso, em alguns pontos a paciência de semanas à espera de um visto ou de um carimbo é de santo...
    O link para o facebook da honda que tem aqui no blog não funciona, talvez tenham mudado ao longo dos anos.

    O meu obrigado por partilhar as aventuras connosco.

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    1. De nada. Ainda bem que gostou. Como constatou tenho feito a viagem ao longo de vários anos, sem pressas. Mas espero acabá-la este ano ou no próximo para depois reunir estas crónicas num livro.
      Cumprimentos

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