Depois daquele
dia passado na floresta, caí na cama, de rastos, às dez da noite. Acordei às
seis e pelas sete estava a tomar o pequeno almoço numa das barracas da vila, ao
lado de um talho de rua onde uma cabeça de vaca olhava para mim. Aqui não há
pão e ovos também não se usam ao pequeno almoço. Tive que me adaptar a comer
uma espécie de esparguete com ervas e sementes mergulhado num caldo quente. Não
era mau. A menina ainda me propôs juntar uns pedaços de carne ou miolos de vaca
àquela sopa mas preferi não arriscar.
Parti pelas oito
e meia para percorrer de volta os 65 Km de estrada de terra que me tinham
levado até ali. Desta vez pude rodar a 90 Km/h nas partes de melhor piso e fiz
aquele trajeto numa hora. Já perto do fim, com as vibrações, soltaram-se os
parafusos que prendem o vidro da carenagem e encostei numa “chafarica” de um miúdo
que reparava pequenas motos, para recolocar as fixações. Uma jovem cliente, que
esperava estendida numa rede presa na parede da barraca que a sua moto ficasse
pronta, levantou-se quando ouviu o barulho da “Cross Tourer” a chegar.
Arranquei, já com
o vidro no sítio, vinte minutos depois e apanhei a partir dali uma boa estrada
alcatroada durante uns cem quilómetros e depois outros 150 Km de mau piso, com
vários troços em terra batida.
Nesta zona do
Norte do Cambodja não há bombas de gasolina como as conhecemos mas apenas
comerciantes que, com um bidão e uma bomba manual, vendem gasolina à porta de
casa ou do estabelecimento, protegidos por um chapéu de sol. Muitas vezes não é
má mas mais cara que nas bombas convencionais, onde nestes países é vendida ao
equivalente a um euro por litro.
À medida que rodo
para sul a temperatura vai aumentando e hoje chegou aos 40º o que, mesmo sem
forros no fato, dá para suar bastante. De vez em quando ponho-me em pé para o
ar entrar pelo blusão.
Nos últimos cem
quilómetros do dia voltei a apanhar estrada boa mas, quando estava a cerca de
60 Km de Kampong Cham, a cidade em que tinha planeado ficar, tive o meu
primeiro furo da viagem. Por sorte estava a atravessar uma aldeia e quando
olhei para o outro lado da rua havia uma dessas oficinas de motos locais. Parei
para reparar o furo e eles estranharam o pneu ser “tubeless”, “como os dos
carros”, referia o patrão. Foram a uma oficina que repara rodas de carros
buscar um taco e, meia hora depois estava outra vez na estrada.
Kampong Cham é
uma cidade gira, sobre o rio, onde volto a encontrar turistas.
No dia seguinte
parti só por volta do meio dia para percorrer os 270 Km que me separavam de
Siem Reap. Voltei a apanhar uma parte em terra batida e mais uma vez os
suportes do vidro, que já estão em mau estado e não tenho para substituir, se
desapertaram.
Siem Reap é
fantástica, atravessada por um estreito rio, com um ambiente extraordinário.
Instalei-me num pequeno Hotel, junto ao rio, cujo proprietário é um francês, filho
de mãe vietnamita, sobrinho da rainha do Cambodja e casado com uma mulher local
linda. Recebeu-me de forma fantástica e convidou-me para jantar com a família.
Á noite dei uma
passeio a pé pela cidade. Uma animada rua com letreiros pendurados a anunciarem
Pub’s Street é preenchida com bares e restaurantes cheios de turistas
ocidentais, com música ao vivo em vários deles cujo som se mistura com o das
bandas de rua, dando um ambiente de festa exótico ao local.
Ali a
prostituição também é um dos atrativos turísticos e os homens dos táxis locais,
pequenas motos com um reboque atrelado onde levam os passageiros, não se cansam
de perguntar: “do you want a girl for bum, bum”?
Na manhã seguinte
fui visitar a cidade velha e ao ver, da avenida de entrada, o Palácio de Angkor
Wat, tive a mesma sensação de quando, há muitos anos atrás, vi pela primeira
vez a imagem de Petra, na Jordania, com o sol da manhã a bater-lhe na fachada,
em cima do dorso de um cavalo, ao descer o estreito desfiladeiro que ali nos
leva. Sentimos uma falta de ar de encantamento por imagens que não são
possíveis de reproduzir fotograficamente.
Aquele que é o
maior monumento religioso do mundo foi mandado construir no século XII pelo rei
Khmer Suryavarman II. Embora seja considerado um templo, na altura Indhu, era a
residência do Rei. É rodeado por um enorme lago artificial em forma de quadrado
e naquelas instalações, que incluíam duas piscinas em pátios interiores e
jardins fabulosos, chegaram a viver 12.500 pessoas, incluindo, segundo reza a
história, 18 bispos hindhus e 615 bailarinas.
Comecei a
imaginar o maravilhoso que deveria ser Reinar naquela época, naquele palácio,
com as bailarinas sempre a dançarem à nossa volta e os bispos a perdoarem-nos
os pecados.
Fui visitar
depois outras ruinas desta fabulosa velha cidade de Angkor Wat onde está
incluído o Palácio Ta Prohm, considerado “World Heritage Site” pela Unesco.
Esteve ao abandono durante séculos e quando o decidiram restaurar, já em pleno
século XXI, optaram, e bem, por manter as seculares árvores que entretanto
tinham crescido à volta e dentro das ruínas, dando-lhe um aspecto
fantasmagórico, aproveitado para as filmagens de “Tomb Raider”.
Ai sim, deve ser lindo, lindo.
ResponderEliminarEstou a gostar. Continuação! como diriam no norte.
Boa viagem, Ana
Obrigado, Ana. A minha mais fiel seguidora do blog. A crónica de hoje foi a ultima antes do intervalo para trabalho, aí pela Europa. A moto ficou em Bangkok. Retomo a viagem em Setembro. Beijinhos
ResponderEliminarFiel seguidora do blog sempre. Profissional ou pessoalmente.
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