De volta à Estrada
Finalmente voltei
a pegar na moto e soube-me que nem queijo fresco em cima de pão alentejano com
muita manteiga. Foi para isso que me meti nesta aventura, embora a parte
burocrática da viagem, no que se refere a vistos e autorizações para a moto
entrar em cada país, seja um mal necessário.
A Embaixada de
Myanmar em Delhí abriu uma porta à possibilidade de me passarem o visto que me
tinha sido recusado na delegação de Dhaka de maneira que aproveitei a
oportunidade, apanhei um avião e fui lá tratar do assunto. Chegado a Delhí
disseram-me que o processo implicava autorizações especiais de dois ministérios
que demorariam pelo menos um mês a obter por isso, enquanto esperava, fui até
Portugal passar Natal e ano novo.
Regressei a New
Delhí no início de Janeiro e, com a imprescindível ajuda da Embaixada
Portuguesa, lá consegui o famoso visto que me garantiram ser o primeiro que
passavam para alguém atravessar o país de moto ou carro. Tive que me deslocar
várias vezes à embaixada de Myanmar e o caricato é que exigiam sempre a minha
presença mas, quando lá chegava, não me deixavam passar do portão e falava com
a secretaria por um telefone que o porteiro me estendia através do guichet. Uma
das vezes, durante este processo, o motorista da Embaixada portuguesa que me
tinha vindo trazer, veio chamar-me aflito porque a polícia o estava a multar
por mau estacionamento. Fui lá explicar a situação e o polícia disse que não
podia desculpar e teria mesmo que me multar mas que passaria uma multa de baixo
valor.
- - Quanto?,
perguntei eu.
- - 100
rupias, respondeu o polícia, ou seja pouco mais de um euro. Há coisas que me
encantam neste país.
Com o visto no
passaporte parti então para o Bangladesh ter com a moto, na vaga esperança de também
aí ter a famigerada autorização para atravessar o país.
O Bangladesh
esteve praticamente parado desde que de lá saí até dois dias antes do meu
regresso, com greves que implicavam a oposição não autorizar veículos a
circularem nas estradas, com os que se atreviam a furar a greve a serem
queimados, junto com os veículos, dentro de carros e camiões. Vários comboios
foram descarrilados por os protestantes retirarem carris em muitas das linhas.
Cheguei ao
aeroporto de Dhaka num clima de grande confusão com a país ainda em caos depois
do fim da greve. À minha espera estava o secretário de cônsul, homem dos seus
65 anos que não consegui distinguir no meio da multidão porque, quando o deixei
há um mês era loiro e agora apresentou-se de cabelo e bigode castanho escuros.
Não tendo ainda conseguido obter a autorização para que eu pudesse atravessar o
país com a moto pedi que me levasse de imediato à estação de comboios com a
ideia de partir nesse mesmo dia para Hilli, a dez horas de distancia, onde
tinha deixado a moto. Quando lá chegámos uma multidão acotovelava-se para
conseguir um lugar nos poucos comboios que começavam a circular, ainda sem
horários. Conseguimos falar com o chefe da estação que nos informou que sim,
viria um comboio que partiria naquela direção dentro de duas ou três horas mas
no qual não haveria lugares marcados e o mais provável era que tivesse que
fazer a viagem em pé. Lugar sentado ou deitado ele achava que só já mesmo no
tejadilho.
Instalei-me então
no Hotel em que já tinha ficado no mês anterior e no dia seguinte consegui
partir para uma cidade a 65 Km de Hilli, de avião.
Era um bimotor a
hélices de uma companhia local, sujo por fora e por dentro e com a tinta exterior
a cair da fuselagem. Deve ter sido comprado em quinta mão e certamente não para
nem para as revisões.
Lá arrancou com
uma barulheira infernal. Quando aterrámos no pequeno aeroporto de Sadair um
miúdo veio a correr estender um degrau de madeira para completar os do avião.
Só então reparei que viajava no mesmo voo um importante deputado local. Ainda
na pista esperava-o uma enorme comitiva e os poucos passageiro que viajávamos
no mesmo voo entrámos no aeroporto por um pequeno corredor aberto no meio de
uma multidão com dezenas de ramos de flores para entregarem ao seu herói. O
homem entrou a seguir a nós e cantaram, louvaram-no, encheram-no de flores e
partiram todos. Cinco minutos depois o aeroporto estava completamente vazio com
o chão coberto por restos de flores.
Depois de
recolher a minha mala na pista, diretamente do carrinho que a traz do avião,
sentei-me sozinho à espera que um homem que tinha contratado ali, na altura,
para me transportar a Hilli chegasse com o carro.
on the road again
ResponderEliminarTem sido difícil por esses lados; povos de merda, mas complicados
Grande abraço e que tudo se recomponha depressa, para que possas continuar sem grandes chatices, e que a gente vá lendo.
Bernardo