Pelas quatro da tarde chegámos a Puerto Obaldia, uma pequena aldeia na
costa que, não sendo a ultima em território Panamiano, é a que tem um pequeno
posto fronteiriço e portanto paragem obrigatória para quem precisa de carimbar
o passaporte com a saída do Panamá.
Talvez para evitar que o barco fosse revistado pelos guardas fronteiriços, decidiram
ancorar ao largo em vez de atracarmos no pequeno porto e deslocámo-nos, o dono
do barco, o comandante e os três que iríamos sair do país, no pequeno bote a
motor até à doca. Fomos recebidos por guardas fronteiriços fortemente armados e
de mau humor que nos anunciaram que o posto de emigração já deveria estar fechado.
Pela parte que lhes competia já tinham fechado os portões que separam a doca da
aldeia. Atravessámos assim uma praia de pedras e um pequeno rio, com uma árvore
caída a fazer de ponte, para chegarmos ao posto quando o homem se preparava
para fechar. Sem contacto por internet tirou, com um telemóvel, fotografias aos
nossos passaportes e subiu a um terraço onde apanhava sinal de rede para enviar
por mensagem as fotografias para a sede, na capital, onde confirmariam a
autorização para deixarmos o país. O Ryan chamou-me a atenção para o ar assustado
do contrabandista de tabaco ao longo de toda a operação que parecia auto denunciar-se
só olhando para a cara dele.
Em La Miel o contrabandista tinha organizada a descarga das muitas caixas de
cigarros para um grande armazém junto ao cais, pertencente ao fornecedor dos
restaurantes da praia. No dia seguinte viriam três lanchas rápidas do porto de
Turbo, na Colômbia, para recolherem o tabaco. Desembarcámos as motos e tratámos
de negociar o seu transporte, em duas pequenas lanchas, para a vila de Capurganá,
três ou quatro milhas à frente e já na Colômbia, onde desembarcam turistas vindos
de mais a Sul, para visitarem a praia de La Miel e uma ou outra ilha por perto.
Instalámo-nos num pequeno Hostel e começamos a procurar alternativas de
transporte por barco até Turbo, onde já há estrada e somos obrigados a parar
para registar a entrada das motos na Colômbia. Não está fácil porque as lanchas
privadas nos pedem uma fortuna para fazerem a viagem com as duas motos e
acabaram por passar três dias até encontrarmos um barco de carga que as pudessem
transportar por um valor razoável. O que vale é que o Hostel era simpático, em cima
do mar, e a diária por pessoa o equivalente a pouco mais de cinco dólares.
Esta manhã fui ao cais, ainda não eram sete, esperar o barco de carga que
chegaria de Sapzuro e poderia transportar as motos até Turbo. Chegou pelas oito
e levei o capitão até ao Hostel para ver o tamanho das motos e acertarmos o
preço do transporte. Partimos da parte da tarde.
Enquanto esperava no porto contaram-me as fofocas do dia. Nessa noite
tinham sido presos vários emigrantes ilegais, provavelmente os africanos que
tinham passado aqui pelo Hostel no dia anterior com os seus haveres embrulhados
em sacos de plástico pretos, a forma que utilizam para atravessar os vários
rios do percurso. Tinham sido capturados numa casa do alto da montanha, onde
também descobriram droga e três colombianos envolvidos no seu transporte para o
Panamá, para onde se preparavam para partir, através das montanhas da Darien Gap.
A mulher do estalajadeiro contou-me ontem que o ano passado passavam aqui
centenas de refugiados, na maioria africanos a caminho do Panamá. Chegavam em lanchas
clandestinas, cobertos por grandes plásticos para os esconderem da guarda
costeira e desembarcavam na praia, fazendo depois o trajecto a pé através das
montanas, num percurso de seis dias que incluía a travessia de vários rios. A
mulher contou-me que via mulheres com bebés ao colo e outras grávidas, percebendo
que dificilmente conseguiriam aguentar as agruras da travessia praticamente sem
comerem. Muitos ficaram pelo caminho.
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