Entretanto, quem chega de barco do Panamá tem que carimbar aqui o passaporte com a entrada na
Colômbia. O homem encarregue da emigração, depois de ter visto a minha moto no
porto, decidiu que eu teria que lhe pagar uma comissão pela passagem da moto.
Eu sabia que era ilegal e disse-lhe que não pagava. O tipo, com ar de mafioso,
cabelo rapado e fato de treino azul berrante, ficou histérico e quando, à porta
do escritório, me gritava que não me daria o carimbo de entrada na Colômbia e eu
teria que voltar para o Panamá, o contrabandista de tabaco vinha a passar na
rua e ficou chocado com a conversa. Chamou-o e perguntou-lhe qual era o
problema. O homem baixou a grimpa e mandou o seu empregado carimbar-me o
passaporte.
Ontem, um brasileiro que por aqui vagueia há dois meses, sem falar uma palavra
de espanhol, e dá a sensação de estar a ficar gravemente transtornado, veio
mais uma vez meter conversa comigo, como a única pessoa presente na “ilha” que
percebe o que ele diz. Contou-me que no dia anterior tinham morto um homem na aldeia
vizinha de Sapzuro. Quando perguntei ao dono do Hostel se sabia de alguma coisa
ele confirmou o crime, sem qualquer expressão de emoção, justificando-o com o facto
do homem ter sido apanhado a roubar.
- Mas isso aqui é normal?
- Sim. É limpeza de gente indesejável. Tem que ser
- E a policia não faz nada?
- Não. Já sabem que tem que ser.
Penso que nestas aldeias, longe da civilização, nem há tribunais e para a
polícia é um problema levar prisioneiros para serem julgados nas cidades
maiores, já ligadas por estrada ao resto do país.
Dois dias depois foi um grupo de emigrantes ilegais que matou o “passador”
numa casa da montanha, por ele lhes ter roubado dinheiro.
Um homem que conheci no porto quando cheguei, um simpático sexagenário com
mau aspecto, só com meia dúzia de dentes na frente, que andava sempre de calções
e tronco nu e me contou ter saído da prisão dois anos antes, onde tinha passado
vinte por narcotráfico, confirmou-me esta lei local popular quando lhe perguntei
se não havia problema em deixar as minhas coisas no porto para sair comprar uma
cerveja.
- Claro. Aqui ninguém rouba nada, principalmente a turistas, porque sabem
que são mortos e o corpo atirado aos peixes. Os turistas são o ganha pão da cidade.
- Quando lhe disse que achava muito tempo vinte anos por traficar droga respondeu com um ar orgulhoso:
- É que eu pertencia ao Cartel de Cali.
Foi ele quem me apresentou o comandante do barco que nos havia de levar, a
nós e às motos, até à cidade de Turbo. Pelas três da tarde foi chamar-me ao
Hostel para trazermos as motos para o Porto mas, quando lá chegámos o barco
ainda estava a descarregar e acabámos por passar a tarde no porto e só embarcar
as motos pelas oito da noite.
Navegámos noite dentro, estendendo os colchões de campismo e sacos cama no
estrado de carga, junto às motos, onde adormecemos. Fomos acordados pela
tripulação às duas da manhã. Tinham encostado o barco a um cais e disseram-nos
que teríamos que desembarcar ali porque o barco, sem cais livre onde poder atracar
durante a noite, ia ficar ancorado ao largo.
- E não podemos dormir no barco e descarregar as motos de manhã?,
perguntei.
- Não, respondeu o capitão. Têm que sair aqui, agora. E arranquem já para
uma bomba de gasolina que há aí quinhentos metros à frente porque esta zona do
porto à noite é muito perigosa.
Ensonados lá arrancamos até à bomba e conseguimos que nos abrissem a porta de
um pequeno Hotel que havia do outro lado da rua, onde ficámos.
Eu admiro-me é o Francisco ainda conseguir dormir...
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