De volta à Índia
Há três dias
voltei à Índia, depois do trabalho que tive na Bélgica.
Este regresso
começou em excelente nível. Tinha marcado um voo desde Lisboa para Calcutá com
escala no Dubai, onde gosto de passar uma noite, não só para cortar o tempo de
viagem como para me habituar melhor à diferença horária. Sempre que posso viajo
na “Emirates” que é, sem duvida, a melhor companhia aérea que conheço. Não só
por os aviões serem novos e estarem sempre limpos, o que não acontece em muitas
das companhias nestes tempos de crise, como pela qualidade das refeições e o
profissionalismo e simpatia das hospedeiras. Fazem lembrar-nos um pouco a TAP de
há vinte ou trinta anos.
Desta vez tive a
sorte de o avião estar cheio e, talvez por eu ser cliente habitual, me terem
feito um “upgrade” para executiva. Viajar em executiva na “Emirates” em longo
curso representa um novo conceito de transporte publico. Vamos tão cómodos e
bem tratados que o tempo passa num abrir e fechar de olhos.
Para não estranhar
este regresso, o Hotel em que fiquei no Dubai fez-me também um upgrade para uma
suite, segundo eles por eu ter chegado à uma da manhã.
No dia seguinte,
já em Calcutá, outra surpresa agradável. O Cônsul tinha acordado com a
administração do melhor Hotel da cidade, um cinco estrelas chamado ITC Sonar,
eu lá ficar à borla durante os três dias que passaria na cidade. O Hotel é espetacular,
com requintes como uma cama com quatro almofadas de diferentes materiais e
texturas para terem a certeza que o cliente encontra a ideal para si, um duche
espaçoso e com muita pressão e nada menos que seis excelentes restaurantes. A
relações publicas, no seu sari impecável em tons de encarnado e dourado, veio
receber-me e levou-me ao quarto, pelo caminho explicando-me todas as
comodidades de que poderia usufruir no Hotel. No quarto, uma moldura em cima da
secretaria com uma fotografia minha na moto e um simpático texto a desejar
óptima estadia e boa viagem.
No dia seguinte
pela manhã apanhei um táxi até ao escritório do Cônsul, onde tinha deixado a
Honda.
Aqui voltei à
realidade da Índia pois enquanto o condutor do táxi que me tinha trazido do
aeroporto no dia anterior parou a meio caminho para pôr gasóleo, este, mal saiu
do Hotel, virou para uma rua com menos movimento e, sem dizer nada, como se da
coisa mais natural do mundo se tratasse, parou o carro e saiu para fazer xixi
na borda da estrada. Reparei que quando voltou ao táxi lavou vagamente as mãos
com a água que sempre transportam numa garrafa de plástico. Isto lembrou-me que
eles no fundo, embora vivam no meio do lixo, que se vê nas cidades por todo o
lado, têm o hábito de se lavarem e mesmo as famílias mais pobres que vivem na
rua lavam-se diariamente com baldes de água e dão banho às crianças nos passeios
embora muitas vezes só com água, sem acesso a sabão. Muitos deste motoristas de
táxi também vivem nos próprios táxis e vem-los, nas horas de descanso, com o táxi
parado na berma da estrada, a dormirem no banco de trás.
Levei a moto até
ao concessionário Honda onde tinha combinado fazer eu a reparação da suspensão
da frente com as peças e ferramenta especial que trouxe de Portugal,
emprestando eles o espaço e restante ferramenta. Nesse dia ainda tive tempo de desmontar
o garfo da moto para no dia seguinte ir lá desarmá-lo para substituir os
retentores que, com a pancada e terra que tinham apanhado nas estradas do Norte
da Índia, estavam a deixar passar óleo.
A operação correu
bem e aproveitei para também substituir os pneus que trouxe comigo no avião de
Lisboa, as proteções plásticas dos punhos, já feitas em cacos, a maneta de
embraiagem que tinha sido remendada quando da minha queda e outros pormenores
como alguns parafusos de fixação da carenagem.
Com a moto já
recondicionada, depois de o concessionário local se recusar a receber qualquer
pagamento, nem mesmo o do óleo de suspensão que usei, parti a caminho do
Bangladesh, pela hora de almoço do dia seguinte, por estradas muito
movimentadas que me obrigam a fazer medias inferiores a 30 Km/h. Cheguei perto
da fronteira já de noite e decidi por isso ficar numa pequena cidade a 5 Km.
Aqui regressei à realidade, ou seja, um Hotel sujo e feio de seis euros por
noite e uma multidão na rua de volta da moto. O quarto é um susto, com a parte
de cima de uma das paredes rôxa, e outra verde alface, enquanto uma barra de
azulejos num tom de roxo escuro a meio das paredes separa essas cores de uma
zona de azulejos azul claro e brancos. O interior da porta está pintado de
castanho e amarelo. Desconfio que o decorador tenha origens chinesas. A
televisão está rodeada de teias de aranha enquanto a prateleira onde está
pousada, coberta de pó, tem também uma garrafa de coca cola vazia deixada pelo
ultimo cliente. A casa de banho suja tem até uma beata no chão e a já habitual,
neste tipo de hotéis, escova de dentes usada, para quem se tenha esquecido da
sua. Quando me entregaram o quarto o dono veio confirmar com os próprios olhos
se o quarto havia sido limpo e deu o seu sinal de aprovação. Sim, está limpo,
disse ele ao sair da inspeção à casa de banho. Estranharam que eu exigisse não
um mas um par de lençóis lavados na cama, o de baixo a cobrir a almofada sem
fronha.
Jantei no
restaurante do Hotel às sete e meia porque não tinha almoçado e durante o
jantar grupos de três homens entravam no restaurante, saídos da multidão que
rodeava a moto, para me perguntarem de que país era e qual a cilindrada e preço
da moto. Muito poucos têm a mínima ideia onde fica Portugal.
Pouco depois de
subir para o quarto o dono do Hotel veio bater-me à porta a pedir que guardasse
a moto dentro do restaurante porque lá fora não paravam de mexer nela.
" A relações publicas, no seu sari impecável em tons de encarnado e dourado, veio receber-me e levou-me ao quarto " - para um recomeço da viagem não está mal, levar-te ao quarto; demonstrou de certeza quão fofa era cama, despiu-se indicando que não era preciso dormir vestido "tá a ver Sahib Francis", não tenho frio, e depois foi uma daquelas noites abrasadoras, digna de um filme...............hein Sr. Francisco, conte lá, não tenha vergonha
ResponderEliminarabrço
bernardo
Ora boas, bem vindo aqui ao Blog. Já tinha saudades.
ResponderEliminarLá vamos nós pela India, suja e peganhenta. Mas a viagem e as primeiras estadias dignas de um Lord britânico sim senhor.
Boa viagem e fico por aqui à espera.
Beijinhos
Ana
Bernardo, essa parte foi depois no meu sonho.
ResponderEliminarPois é, Ana, e parece que vou ter que voltar à Índia para dar a volta pelo Norte ao Bangladesh que isto aqui não está fácil para me deixarem entrar com a moto.